A TUNA EM PORTUGAL - PRÉ-EXISTÊNCIAS ESTUDANTIS
Se
em anterior artigo tratámos de pré-existências de cariz popular, desta feita
tratamos de evidências estudantis anteriores às já detectadas em "Qvid
Tvnae?", que vêm confirmar o que a citada obra já indicava.
Com
efeito, se podemos apontar, grosso modo, o ano de 1888 como o que marca a
institucionalização da Tuna estudantil em Portugal, já bem antes se registava a existência
de grupos deste género, quer de cariz popular quer académico.
No anterior
artigo refere-se a existência de uma estudantina de académicos da UC por volta
de 1868-69, confirmando que, tal como no país vizinho, estes agrupamentos (por
vezes com designações diversas: troupes, academias....) eram de natureza
volátil (com especial actividade no carnaval, desmobilizando-se depois), mas
bem mais comuns do que se julgava.
Damos
à estampa alguns dados, que o blogue Guitarra de Coimbra V publicou em primeira
mão sobre o assunto, com evidências documentais preciosas.
"Realiza-se hoje neste
teatro o espetáculo anunciado a favor das vítimas andaluzas. O programa não
pode ser mais atraente: concerto de bandolins pela estudantina académica do sr.
Jayme de Abreu[1];
a comédia em três atos "Os músicos"; concerto de guitarras[2]; e
recitação de poesias por Ferreira da Silva, Pinto da Rocha[3] e
Eugénio de Castro." [4]
Fonte: Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara
Conimbrigensis), artigo de 12 Janeiro 2016.
"Notícia de uma
estudantina de escolares da UC, de existência efémera, que em setembro/outubro
de 1884 saiu de Coimbra para o Minho e desceu em jornadas pedestres até ao
Algarve. O diário de viagem, com anotações e desenhos seria um documento de
inestimável valor. Será que se encontra esquecido no meio de papeis de algum
dos herdeiros?
Além de organizar caçadas e
peditórios, este grupo fazia serenatas e organizava entradas musicais nas
terras visitadas, com momentos de canto e teatralizações (dança em
coluna/círculo/cadeia, diálogos recitados e cantados, crítica social e ditos
cómicos).
Não se pode afirmar que
tenha havido uma relação direta entre este tipo de estudantinas
portuguesas/espanholas e os grupos de populares que ainda hoje se organizam
pelo carnaval no Baixo Alentejo (Amareleja, Barrancos), alvo dos estudos da
antropóloga Dulce Simões. Mas a colocação dessa hipótese não é descabida. Esta
estudantina de 1884 deve ter deixado fortes marcas no imaginário."
Correspondência de Coimbra, n.º 73, 3.ª feira, 16.09.1884 (pesquisa de José Nascimento) |
Fonte: Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara Conimbrigensis), artigo
de 19 de Abril 2016
"Notícia de imprensa
sobre as estudantinas de escolares que entre março e junho animavam as ruas da
alta de Coimbra trazendo às janelas e varandas muitos curiosos. A febre das
estudantinas serenateiras vinha de trás mas foi incrementada no primeiro semestre
de 1880 devido à programação associada ao tricentenário de Camões que em junho
desse ano foi jubilosamente celebrado. Em janeiro de 1880 tinha sido
constituída uma comissão de estudantes, presidida por A. Henriques da Silva, de
que era relator o músico, compositor, estudante de Direito e regente do Orfeon
Academico João Marcelino Arroyo. Em março já estava devidamente ensaiada e
pronta a começar as rondas pela alta (quando parasse de chover) uma estudantina
de guitarras, violas de arame, violões, rabecas e flautas e violoncelos. Alguns
dos instrumentistas agregados a este formação primaveril eram os guitarristas
José Júlio de Oliveira, Calheiros (?), Matos Silva e Campos (?).
Uma destas estudantinas
tinha cerca de quarenta instrumentistas (alguns dos quais asseguravam vozes e
coros), exibia guitarras, violões, violas de arame, flautas, rabecas e
violoncelos e era regida por um "Sr. Guerra"[5],
cuja identificação não conseguimos apurar. Esta estudantina era iluminada por
archotes, fazia paragens para interpretar repertório instrumental e canções de
homenagem às portas das autoridades locais e levava por junto cerca de duzentos
curiosos.
Algumas destas formações
participaram na serenata fluvial que em 26 de maio encheu o Mondego com
músicas, bandeirolas multicolores e balões venezianos."
O Tribuno Popular, n.º 2531, de 12.05.1880 |
Fonte:
Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara Conimbrigensis), artigo de 27
de Março 2016
[1] Jayme de Abreu, mais conhecido por Jayme Peralta ou
Jayme da guitarra, natural de Fornos de Algodres, fez em Coimbra o liceu e a
Faculdade de Direito/UC. Executante de bandolim e de guitarra, cantor de fados
e serenateiro. Manteve durante a década de 1880 a direção de uma estudantina com
a qual deu concertos e serenatas de rua. O seu estilo performativo foi imitado
por Augusto Hylario.
[2] Instrumentistas não identificados. Nas décadas de
1880-1890 os grupos de guitarras de concerto incluíam frequentemente três a
quatro guitarras com diferentes tamanhos e encordoamentos e um número variável
de violas francesas.
[3] Artur Pinto da Rocha, estudante jurista natural do
Brasil, viveu longos anos em Coimbra, tendo-se repartido por múltiplas
atividades. Foi presidente do primeiro Orpheon (dado a verificar) e da TAUC,
ator amador no Teatro Académico, membro da Sociedade Filantrópica e declamador.
Regressou em Brasil onde exerceu atividade forense e onde recebeu a sua TAUC no
verão de 1925.
[4] O Tribuno
Popular, n.º 3021, de 28 de Janeiro de 1885
[5] Admitindo
que era estudante, nos livros de matrículas referentes ao ano letivo de
1880-1881 encontra-se Silvano Alberto Gomes GUERRA, natural de Valongo de
Milhais, concelho de Murça, distrito de Vila Real, a frequentar o 3.º ano da
FD/UC, que talvez possa ser o nosso regente. Agradecemos ao Adamo Caetano mais
esta colaboração.
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