segunda-feira, 4 de julho de 2016

A TUNA EM PORTUGAL - PRÉ-EXISTÊNCIAS ESTUDANTIS

A TUNA EM PORTUGAL - PRÉ-EXISTÊNCIAS ESTUDANTIS


Se em anterior artigo tratámos de pré-existências de cariz popular, desta feita tratamos de evidências estudantis anteriores às já detectadas em "Qvid Tvnae?", que vêm confirmar o que a citada obra já indicava.
Com efeito, se podemos apontar, grosso modo, o ano de 1888 como o que marca a institucionalização da Tuna estudantil em Portugal, já bem antes se registava a existência de grupos deste género, quer de cariz popular quer académico.
No anterior artigo refere-se a existência de uma estudantina de académicos da UC por volta de 1868-69, confirmando que, tal como no país vizinho, estes agrupamentos (por vezes com designações diversas: troupes, academias....) eram de natureza volátil (com especial actividade no carnaval, desmobilizando-se depois), mas bem mais comuns do que se julgava.

Damos à estampa alguns dados, que o blogue Guitarra de Coimbra V publicou em primeira mão sobre o assunto, com evidências documentais preciosas.


"Realiza-se hoje neste teatro o espetáculo anunciado a favor das vítimas andaluzas. O programa não pode ser mais atraente: concerto de bandolins pela estudantina académica do sr. Jayme de Abreu[1]; a comédia em três atos "Os músicos"; concerto de guitarras[2]; e recitação de poesias por Ferreira da Silva, Pinto da Rocha[3] e Eugénio de Castro." [4]

Fonte: Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara Conimbrigensis), artigo de 12 Janeiro 2016.


"Notícia de uma estudantina de escolares da UC, de existência efémera, que em setembro/outubro de 1884 saiu de Coimbra para o Minho e desceu em jornadas pedestres até ao Algarve. O diário de viagem, com anotações e desenhos seria um documento de inestimável valor. Será que se encontra esquecido no meio de papeis de algum dos herdeiros?
Além de organizar caçadas e peditórios, este grupo fazia serenatas e organizava entradas musicais nas terras visitadas, com momentos de canto e teatralizações (dança em coluna/círculo/cadeia, diálogos recitados e cantados, crítica social e ditos cómicos).
Não se pode afirmar que tenha havido uma relação direta entre este tipo de estudantinas portuguesas/espanholas e os grupos de populares que ainda hoje se organizam pelo carnaval no Baixo Alentejo (Amareleja, Barrancos), alvo dos estudos da antropóloga Dulce Simões. Mas a colocação dessa hipótese não é descabida. Esta estudantina de 1884 deve ter deixado fortes marcas no imaginário."


Correspondência de Coimbra, n.º 73, 3.ª feira, 16.09.1884
(pesquisa de José Nascimento)
Fonte: Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara Conimbrigensis), artigo de 19 de Abril 2016




"Notícia de imprensa sobre as estudantinas de escolares que entre março e junho animavam as ruas da alta de Coimbra trazendo às janelas e varandas muitos curiosos. A febre das estudantinas serenateiras vinha de trás mas foi incrementada no primeiro semestre de 1880 devido à programação associada ao tricentenário de Camões que em junho desse ano foi jubilosamente celebrado. Em janeiro de 1880 tinha sido constituída uma comissão de estudantes, presidida por A. Henriques da Silva, de que era relator o músico, compositor, estudante de Direito e regente do Orfeon Academico João Marcelino Arroyo. Em março já estava devidamente ensaiada e pronta a começar as rondas pela alta (quando parasse de chover) uma estudantina de guitarras, violas de arame, violões, rabecas e flautas e violoncelos. Alguns dos instrumentistas agregados a este formação primaveril eram os guitarristas José Júlio de Oliveira, Calheiros (?), Matos Silva e Campos (?).
Uma destas estudantinas tinha cerca de quarenta instrumentistas (alguns dos quais asseguravam vozes e coros), exibia guitarras, violões, violas de arame, flautas, rabecas e violoncelos e era regida por um "Sr. Guerra"[5], cuja identificação não conseguimos apurar. Esta estudantina era iluminada por archotes, fazia paragens para interpretar repertório instrumental e canções de homenagem às portas das autoridades locais e levava por junto cerca de duzentos curiosos.
Algumas destas formações participaram na serenata fluvial que em 26 de maio encheu o Mondego com músicas, bandeirolas multicolores e balões venezianos."



 O Tribuno Popular, n.º 2531, de 12.05.1880

Fonte: Octávio Sérgio/A. M. Nunes in Guitarra de Coimbra V (Cithara Conimbrigensis), artigo de 27 de Março 2016







[1] Jayme de Abreu, mais conhecido por Jayme Peralta ou Jayme da guitarra, natural de Fornos de Algodres, fez em Coimbra o liceu e a Faculdade de Direito/UC. Executante de bandolim e de guitarra, cantor de fados e serenateiro. Manteve durante a década de 1880 a direção de uma estudantina com a qual deu concertos e serenatas de rua. O seu estilo performativo foi imitado por Augusto Hylario.
[2] Instrumentistas não identificados. Nas décadas de 1880-1890 os grupos de guitarras de concerto incluíam frequentemente três a quatro guitarras com diferentes tamanhos e encordoamentos e um número variável de violas francesas.
[3] Artur Pinto da Rocha, estudante jurista natural do Brasil, viveu longos anos em Coimbra, tendo-se repartido por múltiplas atividades. Foi presidente do primeiro Orpheon (dado a verificar) e da TAUC, ator amador no Teatro Académico, membro da Sociedade Filantrópica e declamador. Regressou em Brasil onde exerceu atividade forense e onde recebeu a sua TAUC no verão de 1925.
[4] O Tribuno Popular, n.º 3021, de 28 de Janeiro de 1885
[5] Admitindo que era estudante, nos livros de matrículas referentes ao ano letivo de 1880-1881 encontra-se Silvano Alberto Gomes GUERRA, natural de Valongo de Milhais, concelho de Murça, distrito de Vila Real, a frequentar o 3.º ano da FD/UC, que talvez possa ser o nosso regente. Agradecemos ao Adamo Caetano mais esta colaboração.

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