segunda-feira, 11 de julho de 2016

Tunas Populares - Um fenómeno pouco valorizado



O fenómeno das estudantinas/tunas de cariz popular está, como as suas congéneres estudantis, inserido no amplo fenómeno das orquestras de plectro que se difundiram por toda a Europa e pelo mundo, a partir do primeiro quartel do séc. XIX.
São, no nosso país (pelo menos), o mais importante fenómeno de democratização da música erudita e do acesso aos instrumentos antes reservados a bolsas mais fartas e a quem tivesse sustento para estudar música.
A obra de referência sobre tunas populares
Salvo poucos etnomusicólogos, como José Alberto Sardinha, a larga maioria dos sociólogos  e musicólogos ignorou olimpicamente este facto e o impacto que as tunas tiveram, no seu papel cultural, social e musical em Portugal.
Como refere J. A. Sardinha (2005), citado em "Qvid Tunae?" (2011), «...estas formações foram porta de entrada de repertório erudito na tradição oral popular portuguesa[1]

Não há como negar a importância destas orquestras de plectro, de cariz popular, rural e urbano, cuja existência se conta às centenas por todo o país (não havendo quase aldeia ou vila que não tivesse a sua, chegando a haver tunas rivais numa mesma aldeia) e que impulsionaram e representaram um movimento musical ímpar que nem mesmo o fenómeno das filarmónicas terá suplantado.
E foi desse processo de aculturação que se desenvolve aquilo a que se acabará por chamar de "música popular" (tantas vezes, por ignorância, colocado no campo oposto à música dita "erudita" ou "clássica"):


"Durante esse processo, estes agrupamentos foram‑se metamorfoseando em, cruzando com, influenciando e sendo influenciadas por grupos congéneres, como as tocatas dos ranchos folclóricos, acolhendo no seu seio instrumentos estranhos ao modelo original, nomeadamente as violas de arame[2], cavaquinhos e guitarras portuguesas, e, bem assim, toda uma panóplia de instrumentos de percussão regional – sarroncas, púcaros, bombos, tarolas, tamboris, castanholas, adufes, reco‑recos, triângulos, etc.

Por outro lado, os bandolins começaram a aparecer nas tocatas ao lado dos instrumentos tradicionais. A este fenómeno de entrecruzamento não é alheio o facto de quase sempre os executantes da tocata darem uma mãozinha à tuna, e vice‑versa. Assim, tanto o repertório tradicional passou para as tunas como o contrário: os corridinhos começam a ser tocados como «chotiças»[3]; as chulas, como valsas; aparecem os «viras‑valseados», as contradanças e os «balancés», as quadrilhas, os dobrados (pasodobles) e toda uma série de ritmos «novos», que rapidamente ganham foro de «tradicionais» sendo incorporados no fundo musical dito «popular». " [4]

Aqui se deixam algumas imagens e fotos de tunas de cariz popular rural e urbano de finais do séc. XIX e inícios do XX (sem repetir as que já publicadas no artigo dedicado a pré-existências populares).



Bilhete Postal - Tuna Comercial de Lisboa, 1903-04
Publicado na Ilustração Portuguesa Is25, p. 13, de 25 de Abril de 1904 e citado em Qvid Tvnae?, p. 208

Tuna Travanquense, fundada em finais do séc. XIX, aqui em 1909
(Publicado por João Duarte no blogue travancacomhistoria.blogspot.pt)

Bilhete Postal - Tuna Comercial de Lisboa, ed. 1911
Foto publicada também no jornal O Século, de 14 de Outubro de 1906, p. 12,
e em QVID TVNAE?, p. 209

Estudantina Nicolino Milano (disfarçados de tunos espanhóis) no Carnaval de Lisboa,
Ilustração Portugueza, 1ª Ano, Nº 71, de 13 de Março de 1905, p. 294
(Hemeroteca Municipal de Lisboa). B

Grupo Manuel Passos Freitas, Funchal (Madeira), 1918.
(Acervo do Museu de Etnologia de Lisboa)

Grupo musical de amadores apresenta em Cuba, Alentejo, uma tuna masculina de inspiração estudantil.
(Ilustração Portuguesa n.º 698, de Julho de 1919, p. 15)

Postal Ilustrado Nº 17- Serenata Thomarense, junto à porta do Convento de Cristo
(Collecção da Havaneza de Thomar, ca. 1905)

Tuna Amadores de Música Passos de Freitas,
Illustração Portugueza, II Série, Nº 678, de 17 Fevereiro de 1919, p. 138
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna Associação de Empregados Comércio de Santarém,
Illustração Portuguesa, II Série, Nº 414, de 26 Janeiro de 1914, p.127
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna Cartaxerse (Cartaxo),
 Illustração Portugueza, II Série, Nº 600, de 20 Agosto de 1917, p. 159
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna da Associação dos Caixeiros Leirienses,
 Ilustração Portugueza, 2ª série, Nº 907, de 07 Julho de 1923, p.12
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna de Alfaiates, durante a 1ª guerra mundial, ca. 1918
(In hblogue valadodosfradesfotos.blogspot)
publicado em QVID TVNAE?, p. 241 

Tuna de Aradas (Aveiro), ca. 1910 (Acervo de David Paiva Martins)

Tuna de Bandolins da Casa do Povo da Camacha 1947
 (In site bandolins-madeira.net) publicado em QVID TVNAE?, p. 242

Tuna de bandolins do Laranjal, Santo António do Funchal (Madeira), 1938
(Photographia – Museu Vicentes, in bandolins-madeira.net)

Tuna de Benfica do Ribatejo,  1915
(in blogue benficadoribatejo.blogspot.pt)

Tuna de Benfica do Ribatejo, ca 1920
(in blogue benficadoribatejo.blogspot.pt)


Tuna de Empregados do Comércio de Beja, 1906
(Jornal O Século, 10 de Dezembro, p.5 - Arquivo Nacional Torre do Tombo)
publicado em QVID TVNAE?, p. 240

Tuna Peroselo (Penafiel), ca. 1910

Tuna de Redondo, 1903 (Coleção particular Luís Mocho)

Tuna do Atheneu Commercial de Lisboa,
 Ilustração Portugueza, II Ano, Nº 85, de 19 de Junho de 1905, p.523
(Hemeroteca Municipal de Lisboa).

Tuna do Club Ginástico Portuguez do Rio de Janeiro,
Illustração Portuguesa, II Série, Nº 429, de 11 Maio de 1914, p.598
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna dos Caixeiros de Guimarães, c. 1900
(Recolha de Manuel Soares)

Tuna Empregados Comércio Penamacor (ca. 1919)

Tuna Empregados de Comércio de Loanda,
Illustração Portuguesa, II Série, Nº 445, de 31 Agosto de 1914, p.269
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna Louletana,
Illustração Portuguesa, II Série, Nº 388, de 28 Julho de 1913, p.127
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

Tuna Riomaiorense (Rio Maior), ca. 1920
(Fernando Duarte in "História de Rio Maior")


Tuna Orfeão de Silvalde (São Tiago de Silvalde - Aveiro), ca. 1920

Troupe Freitas Gazul, 1893
(Revista - O António Maria Vol. IX, de 23Fevereiro)
publicado em QVID TVNAE?, p. 205

Troupe Gounod, 1894
(O António Maria, 28 Dezembro, p.174)
publicado em QVID TVNAE?, p. 205

Tuna do Ateneu Comercial, 1905, Someiro,
Revista Occidente,  Vol. 28, nº 960, p. 189
(Hemeroteca Municipal de Lisboa).
publicado em QVID TVNAE?, p. 209

Tuna do Atheneu Comercial de Lisboa, 1906
(Brasil-Portugal - Lisboa - A. 8, vol. 8, nº 190, 16 Dez., p. 344)
publicado em QVID TVNAE?, p. 210

Tuna Orquestra da União dos Empregados de Comércio do Porto, ca. 1912
(O Tripeiro nº 6, Ano XI de Outubro 1955 p. 172).

Tuna Orquestra da União dos Empregados do Comércio do Porto, 1912
 Illustração Portugueza Nº 330, 17 Junho, p. 785
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)
publicado em QVID TVNAE?, p. 226

Tuna de senhoras, 1907, com cliché de P. Marinho
(Brasil-Portugal. - Lisboa. - A. 9, vol. 9, nº 194, 16 Fev., p. 28-29)
publicado em QVID TVNAE?, p. 211

Investigação pessoal, 2016




[1] José Alberto Sardinha, em entrevista a João Pedro Oliveira, DN (12 de Setembro de 2005).
[2] Nas suas múltiplas designações regionais: braguesas, amarantinas, campaniças, toeiras, beiroas, bandurras, da terra, etc.
[3] Corruptela popular de schottische (escocesa).
[4] COELHO, Eduardo, SILVA, Jean-Pierre, TAVARES, Ricardo, SOUSA João Paulo - QVID TVNAE? A Tuna estudantil em Portugal - Euedito, 2011, pp.301-302.

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