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quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Investigação Tuneril - Uma tarefa de, e para, todos.

É certo que, nos últimos 20 anos, a investigação tuneril deu um enorme salto e garantiu a maioridade, com uma profusa produção de obras sobre a Tuna (em termos historiográficos) e sobre tunas (na vertente biográfica).

Nas últimas duas décadas, em termos de historiografia tunante, passou a imperar um critério de rigor e de metodologia investigativa já não compaginável com pseudo-estudos polvilhados de ideologias e narrativas ficcionadas, onde os autores moldavam e talhavam os factos à medida das suas próprias crenças (pese embora ainda haver disso, nomeadamente em Espanha).

Mas está ainda muito por fazer.

No estrito caso português, e apesar do trabalho meritório e ímpar traduzido na obra "Qvid Tvnae?", é virtualmente impossível chegar a todo o lado - mesmo sendo Portugal um país geograficamente pequeno.

Lamentavelmente, grande parte dos fundos e arquivos locais não está acessível à distância (falta de medidas políticas e investimento subsequente) - e muitos desses fundos e arquivos nem digitalizados estão. Nesse ponto, vivemos verdadeiramente na cauda da Europa.

Se mais não sabemos sobre a nossa história tuneril, não é apenas por este tipo de questões técnicas, mas por uma enorme falta de mobilização da comunidade tunante para estas questões. 

A preservação e valorização do património e  tradição tuneril é algo que, quase sempre, serve apenas de chavão para "inglês ver". As Tunas não podem preservar e defender uma tradição que desconhecem (estando mais aptas, portanto, a desvirtuar o que dizem promover). Chega a ser caricato que os protagonistas, os que militam e exercem o mester tunante, sejam, grosso modo, tão ignorantes sobre o fenómeno como outro qualquer leigo, alheio às Tunas.

Neste últimos 20 anos, foram produzidas diversas obras biográficas sobre tunas, mas salvo a lançada pelo João Paulo Sousa, em 2001[1], nenhuma das demais procurou sequer urdir uma introdução histórica que trouxesse a lume alguns aspectos históricos das tunas que outrora existiram na sua geografia local. As Tunas não nasceram na década de 1980, e muito menos a "tradição" se resume àquela que cada um bebeu empiricamente, absorveu "de ouvido" ou, pior, decidiu inventar com base no "achismo".

Se em cada localidade onde há uma Tuna, alguém tivesse tido a boa ideia de fazer alguma pesquisa histórica, teria certamente suprido a evidente impossibilidade de algum investigador de Faro conseguir aceder a informações sobre Braga (ou alguém de Viana poder consultar acervos em Beja).


Difícil, mesmo impossível, portanto, urdir um estudo mais completo da Tuna portuguesa (em termos de pormenor), quando os que a isso se propõem são poucos e não têm, obviamente, o dom da ubiquidade.

Complicado, dadas as limitações técnicas, aceder a acervos que não foram digitalizados e partilhados na web (apesar de já haver muita coisa).

Ainda assim, já muito se conseguiu desde o lançamento do "Qvid" em 2011-12 (e ampliará substancialmente a dimensão da sua nova versão)[2], mas o que demora uma década a fazer-se seria em muito encurtado ou, então, teria produzido muito mais dados, se mais gente houvesse com gosto em saber (descalçando os  cómodos chinelos).

Mas mesmo no que respeita a fontes ao alcance de um click, os investigadores deparam-se com uma titânica tarefa de busca.

Ao contrário do que sucede com outros acervos online, quase tudo o que existe digitalizado em Portugal não permite pesquisa por palavras, pois essa digitalização omitiu o reconhecimento OCR e não foram criados motores internos de busca. Tal obriga, na prática, a ter de ler tudo de fio a pavio, materializando-se a empreitada no ditado "procurar uma agulha num palheiro".

E quando são poucos a empreender investigação, tudo leva anos e anos, porque uma mão de pares de olhos não dá conta de algo que precisaria de mais implicados, de muitos mais olhos, distribuídos geograficamente.


Visitar o arquivo ou hemeroteca local é um exercício simples. Pedir para consultar jornais antigos, tomar notas e/ou tirar fotos de dados encontrados e registar cronologicamente o que se encontra não é tarefa complicada, se o âmbito da pesquisa for muito localizado geograficamente (mais ainda se, colaborativamente, dividirem a tarefa com mais 2 ou 3, distribuindo limites cronológicos).

Mas imaginem ter de fazer isso para um país inteiro, ao largo de mais de 100 anos, com apenas uma mão cheia de pessoas (e, ainda, abarcar outros territórios). 

O desafio é simples: quando decidirem publicar uma obra biográfica sobre a vossa tuna, procurem enriquecê-la com uma introdução histórica que recupere a memória passada da vossa cidade/região, ofereçam aos leitores algo mais, algo que, muitas vezes, será uma descoberta inédita e conferirá outra importância ao que apresentam.

Para que, no futuro, outros tratem esta nossa época com rigor, cuidado e carinho, convirá que demos esse mesmo exemplo, deixando-o como testemunho aos vindouros. Uma tarefa que é de todos, tanto mais quanto seja feita para todos.



[1] A obra "10 Anos de Infantuna", inseriu, num capítulo introdutório de  10 páginas, uma contextualização histórica onde apresenta dados de uma investigação feita a jornais antigos, trazendo à tona notícias de uma Tuna Académica de Viseu de finais do séc. XIX.

[2] Para além das investigações do grupo CoSaGaPe, há a salientar o trabalho de Rui Marques, resultando numa Tese de Doutoramento em Etnomusicologia dedicada à Tuna em Portugal

sábado, 7 de março de 2020

Investigar em Portugal - Trabalho de hoje com ferramentas de ontem.


Fazer investigação a partir de periódicos e outras publicações, em Portugal, será das tarefas mais complicadas e ingratas.

A investigação sobre Tunas não foge à regra, sendo até, em muitos casos, ainda mais difícil, tendo em conta que pouco foi desbravado no que concerne ao levantamento documental de evidências.

Ao contrário do que se sucede, por exemplo, em França e em Espanha, onde, no caso da imprensa, os exemplares estão digitalizados com reconhecimento OCR (reconhecimento de caracteres), em Portugal são raríssimos os casos em que tal sucede (até hoje encontrei menos de uma meia dúzia de periódicos nessas condições).

O reconhecimento OCR permite a busca por palavras, dentro do documento, poupando anos de investigação.


Mas a grande vantagem dos dois países acima mencionados é que as estruturas responsáveis pelo acervo disponibilizam igualmente um motor de busca que permite a pesquisa por palavras não apenas a 1 periódico em específico, mas estende a busca a todos os documentos digitalizados existentes, apresentando, depois, as ocorrências por relevância, data, etc.

Em Portugal, não existem motores de busca desse género, algo incompreensível e, de certo modo, inaceitável.
Em Portugal, as colecções online, disponibilizadas em PDF, são digitalizações em formato de imagem, sem reconhecimento OCR. Em alguns casos (como na BNP), nem sequer uma referenciação por localidade (como sucede na Hemeroteca Digital de Lisboa).
Se é verdade que já é uma enorme vantagem  haver documentação online - e não ter de fazer deslocações para aceder (podendo fazer-se a partir de casa), o facto é que continua a ser necessário abrir cada exemplar e lê-lo de fio a pavio, à procura do que se pretende.

E só estamos a falar do acesso online, porque são ainda muitas centenas de documentos e periódicos que é preciso consultar presencialmente (algo simplesmente inaceitável, hoje em dia, para muitos documentos como são os jornais), num país que se quer na vanguarda tecnológica (e fez disso política desde o tempo do Sócrates e do seu Plano Tecnológico, dos seus "Magalhães", quadros interactivos e afins).

Ora, o leitor faça esta simples conta de merceeiro:

1 ano tem 52 semanas.
Pegando num periódico diário (normalmente são 6 exemplares por semana, folgando um dia), teremos nada menos que ca. 312 jornais para ler (a variar entre a 4 e as 6 páginas - umas vezes menos e outras mais) nesse ano. Estamos a falar de cerca de 1200 a 1800 páginas.
Isto só para 1 ano!
Basta imaginar a trabalheira que dá, nem que seja para um periódico que só existiu, imaginemos, 10 anos (há-os com maior longevidade e, alguns, com publicação ininterrupta da década de 1870 à actualidade).

O leitor imagine o tempo, o esforço e resiliência dispensados a pesquisar por assuntos específicos como são as tunas/estudantinas, ao longo de milhares de páginas. E, depois, lá se vão umas dioptrias (ler num ecrã de computador desgasta e cansa mais).
Leitura de centenas e centenas de páginas, por vezes sem qualquer retorno (chega a haver periódicos onde nada se encontra em 2, 3 ou mais anos pesquisados) que obriga o investigador a confrontar-se tantas vezes com a frustração (embora também seja recompensado na perseverança, encontrando, não poucas vezes, dados riquíssimos e inéditos).

Havendo várias centenas de periódicos a abranger o período que vai de inícios do séc. XIX até, pelo menos, 1980 (para não ir mais longe), bem se reconhece a tarefa quase impossível que se tem pela frente.
E isto só para Portugal. 

Se a pesquisa está facilitada em França e Espanha, há que também contar com outros países onde o fenómeno Tuna/Estudiantina se manifestou (alguns com o mesmo problema que o lusitano, diga-se).

Voltando ao nosso espaço geográfico português, apenas constatar que é simplesmente paradoxal que se gaste, tantas e tantas vezes, dinheiro em inutilidades, mas para dotar bibliotecas de meios e pessoas - para a tarefa de catalogar, digitalizar e fazer um verdadeiro "simplex" de acervos documentais digitalizados, não haja meios de nos colocar a par com os demais parceiros europeus.

Vale a pena meditar sobre isto, nem que seja para que o trabalho de investigação e os investigadores sejam mais reconhecidos e, quiçá, um dia, alguém com poder de decisão faça alguma coisa para mudar o estado actual das coisas.

Entrementes, volto à labuta, que se tornou, há muito tempo a esta parte, diária, de percorrer periódicos.

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Falar e fazer - Nos antípodas de uma concepção.


Não, não se trata de uma apologia do ego, nem pouco que se pareça.
Mas importa que seja dado o seu a seu dono, sem penachos, sem "folie des grandeurs", mas sendo, acima de tudo, honesto.
Todos temos direito a envaidecer-nos com o trabalho bem feito. Qualquer pessoa normal sente gosto e orgulho de um trabalho bem feito que é reconhecido, mesmo que com lapsos aqui, acolá.

Mas, volta e meia,  aparecem ressabiados a criticar o que é feito, dizendo que os tempos são outros - incompatíveis com a oferta que é produzida porque, pasme-se, a linguagem é jurássica e a malta "de agora" quer é outras formas de partilha de informação, outras plataformas, outros modos de fazer.

Outros modos de fazer... não fazendo coisa nenhuma, diga-se.

Murphy bem pode criar uma nova lei: "São sempre os mesmos a criticar sem fazer, e sempre os mesmos a fazer e a serem criticados por isso". 


 "Nunca serás criticado por alguém que esteja a fazer mais do que tu; antes serás criticado por alguém que esteja a fazer menos que tu". Nesta citação, atribuída a Steve Jobs, nem sequer podemos falar em "fazer menos", pois que, em boa verdade, os críticos que se manifestam (honra lhes seja dada, porque dão a cara - contrariamente a outros que "mordem pela calada"), achando que o que é feito nunca satisfaz, são pessoas sem qualquer obra feita.
Atiram postas de pescada, mas fazer...está quieto!

A verdade, e é uma infeliz realidade, é que são sempre os mesmos que encontramos a fazer, a apresentar, a criar conteúdos, a apresentar materiais, dados, informações.
A produção informativa e formativa que existe concentra o mesmo grupo restrito de pessoas, as quais não têm culpa da inércia de terceiros.
São sempre os mesmos que encontramos e a culpa não é deles; antes pelo contrário, ainda bem que há quem faça. Pena é não haver mais. Mas esses "mais" teimam em não aparecer (apenas uns "menos", armados em "mais").
Sempre os mesmos que encontramos a investigar, criar e/ou dinamizar portais, blogues, publicação de livros, criação de grupos e fóruns, páginas diversas, a produzirem conteúdos, artigos de investigação, a participarem em encontros, palestras, conferências, que encontramos como colaboradores de diversas entidades.... a custo zero para quem usufrui desse labor.

Quem faz não está isento de reparo, mas é estranho que essas críticas sejam atiradas por quem não possui qualquer credibilidade. Palavras sem obras são tiros sem balas. Muito barulho, muito fumo e, depois, desvanecida a névoa, ficam os mesmos de sempre porque os delatores, esses...rabinho entre as pernas.
Depois vêm as fáceis e costumeiras acusações de sobranceria de quem mais não tem do que acusar, agarrando-se a apreciações de forma e a fulanizações néscias, numa vitimização que procura apoios que escondam a sua própria insuficiência.

Acusados de "velhos do Restelo", muitas vezes em surdina, como pessoas que não compreendem o tempo actual (como se estivessem mortos), pretendendo que o que viveram nada tem a ver com o que é hoje a Tuna. Tudo artifícios estéreis, ignorando ou omitindo um facto: conhecem (porque estão e porque estiveram). Viveram como protagonistas (ensaiando, organizando certames, compondo temas, participando, liderando estruturas.....), mas também observam, estudam, contactam... com um mundo que ajudaram a edificar (no alvores do "boom") e que continua sendo o mesmo, apenas com mais e novos protagonistas, atravessando modas, tendências, altos e baixos.
Fazem sombra? Não. Nem fazem nem nunca estiveram à sombra, contrariamente a quem lá vegeta e se lembra, quando o rei faz anos, de deitar a cabeça de fora e piar.

Mas não é nada de novo. Há tempos foi publicado um artigo (por um desses que estão sempre e tem currículo para falar de cátedra) que abordava precisamente esta questão.

Há pessoas que, de umbigos desmesurados, ainda não perceberam que não existe monopólio sobre obra feita. O que existe são os que falam e, do outro lado, os que fazem (e podem falar com alguma propriedade).
Todos têm direito à sua opinião. Mas opinar para pôr em causa o trabalho meritório feito, carece de algo mais e terá credibilidade na exacta medida que vem acompanhada de obra feita.





Ora, argumentar com quem só manda bitaites é conversa estéril.
Como dizia um amigo (também daqueles que pode falar de cátedra), "Só há discussão quando ambos os lados estão em paridade (...) Opiniões, toda a gente tem; Infelizmente toda a gente as dá. E é por isso mesmo que raramente há discussão: quando só um dos lados apresenta factos (obra)...".

Por isso, quando aparecem os arautos dos novos tempos, pensando descobrir a pólvora, cheios de alternativas, de planos, de projectos...para "modernizar", trazer a Tuna ao séc. XXI - por contraposição com o que consideram "démodé" ou "obsoleto", só temos a dizer: "Força! Façam, apresentem, criem!".
Só que, quando a isso desafiados, quando se diz "Então façam!", fazem lembrar a história bíblica dos apedrejadores que começaram a sair um por um.
É que não basta clamar por novos design, novas plataformas, novas funcionalidades, novos layout, como se tudo se resumisse a trabalho de cosmética. É preciso ter conteúdos.
E para criar conteúdos é preciso queimar a pestana: ler, estudar, conhecer, investigar, comparar, escrever....fazer.

Concede-se que nem todos estão vocacionados, nem todos possuem disponibilidade, que outros não dispõe de "Know how" ou de interesse. Mas, pelo menos, e são a maioria, é pessoal que não se atira a disparar por invejoso belicismo.
Usualmente é malta que reconhece, como é devido, o trabalho feito, o mérito, esforço e procura enriquecer-se desse mesmo labor.
Outros criticam - muitos sem sequer aferir do trabalho.... muitos sem abrir uma página.

Falar é fácil. Sempre foi.
Mas a caravana passa, como sempre passou, porque, contas feitas, seremos pesados pelo que fizemos, sendo as boas intenções de boca atiradas para o esquecimento e os contestatários avulso enterrados sem lápide.