É certo
que, nos últimos 20 anos, a investigação tuneril deu um enorme salto e garantiu
a maioridade, com uma profusa produção de obras sobre a Tuna (em termos
historiográficos) e sobre tunas (na vertente biográfica).
Nas últimas duas décadas, em termos de historiografia tunante, passou a imperar um critério de rigor e de metodologia
investigativa já não compaginável com pseudo-estudos polvilhados de ideologias
e narrativas ficcionadas, onde os autores moldavam e talhavam os factos à
medida das suas próprias crenças (pese embora ainda haver disso, nomeadamente em
Espanha).
Mas
está ainda muito por fazer.
No
estrito caso português, e apesar do trabalho meritório e ímpar traduzido na
obra "Qvid
Tvnae?",
é virtualmente impossível chegar a todo o lado - mesmo sendo Portugal um país
geograficamente pequeno.
Lamentavelmente,
grande parte dos fundos e arquivos locais não está acessível à distância
(falta de medidas políticas e investimento subsequente) - e muitos desses fundos e arquivos nem digitalizados estão. Nesse
ponto, vivemos verdadeiramente na cauda da Europa.
Se
mais não sabemos sobre a nossa história tuneril, não é apenas por este tipo de
questões técnicas, mas por uma enorme falta de mobilização da comunidade
tunante para estas questões.
A preservação e valorização do património e tradição tuneril é algo que, quase sempre, serve apenas de chavão para "inglês ver". As Tunas não podem preservar e defender uma tradição que desconhecem (estando mais aptas, portanto, a desvirtuar o que dizem promover). Chega
a ser caricato que os protagonistas, os que militam e exercem o mester tunante,
sejam, grosso modo, tão ignorantes sobre o fenómeno como outro qualquer leigo, alheio às Tunas.
Neste
últimos 20 anos, foram produzidas diversas obras biográficas sobre tunas, mas salvo
a lançada pelo João Paulo Sousa, em 2001,
nenhuma das demais procurou sequer urdir uma introdução histórica que trouxesse
a lume alguns aspectos históricos das tunas que outrora existiram na sua
geografia local. As Tunas não nasceram na década de 1980, e muito menos a "tradição" se resume àquela que cada um bebeu empiricamente, absorveu "de ouvido" ou, pior, decidiu inventar com base no "achismo".
Se
em cada localidade onde há uma Tuna, alguém tivesse tido a boa ideia de fazer
alguma pesquisa histórica, teria certamente suprido a evidente impossibilidade
de algum investigador de Faro conseguir aceder a informações sobre Braga (ou
alguém de Viana poder consultar acervos em Beja).
Difícil,
mesmo impossível, portanto, urdir um estudo mais completo da Tuna portuguesa (em termos de pormenor),
quando os que a isso se propõem são poucos e não têm, obviamente, o dom da
ubiquidade.
Complicado,
dadas as limitações técnicas, aceder a acervos que não foram digitalizados e
partilhados na web (apesar de já haver muita coisa).
Ainda
assim, já muito se conseguiu desde o lançamento do "Qvid" em 2011-12
(e ampliará substancialmente a dimensão da sua nova versão),
mas o que demora uma década a fazer-se seria em muito encurtado ou, então,
teria produzido muito mais dados, se mais gente houvesse com gosto em saber (descalçando
os cómodos chinelos).
Mas
mesmo no que respeita a fontes ao alcance de um click, os investigadores
deparam-se com uma titânica tarefa de busca.
Ao
contrário do que sucede com outros acervos online, quase tudo o que existe
digitalizado em Portugal não permite pesquisa por palavras, pois essa
digitalização omitiu o reconhecimento OCR e não foram criados motores internos
de busca. Tal obriga, na prática, a ter de ler tudo de fio a pavio,
materializando-se a empreitada no ditado "procurar uma agulha num
palheiro".
E
quando são poucos a empreender investigação, tudo leva anos e anos, porque uma
mão de pares de olhos não dá conta de algo que precisaria de mais implicados,
de muitos mais olhos, distribuídos geograficamente.
Visitar
o arquivo ou hemeroteca local é um exercício simples. Pedir para consultar
jornais antigos, tomar notas e/ou tirar fotos de dados encontrados e registar
cronologicamente o que se encontra não é tarefa complicada, se o âmbito da
pesquisa for muito localizado geograficamente (mais ainda se, colaborativamente,
dividirem a tarefa com mais 2 ou 3, distribuindo limites cronológicos).
Mas
imaginem ter de fazer isso para um país inteiro, ao largo de mais de 100 anos, com apenas
uma mão cheia de pessoas (e, ainda, abarcar outros territórios).
O desafio é simples: quando decidirem publicar uma obra biográfica sobre a
vossa tuna, procurem enriquecê-la com uma introdução histórica que recupere a
memória passada da vossa cidade/região, ofereçam aos leitores algo mais, algo
que, muitas vezes, será uma descoberta inédita e conferirá outra importância ao
que apresentam.
Para que, no futuro, outros tratem esta nossa época com rigor, cuidado e carinho, convirá que demos esse mesmo exemplo, deixando-o como testemunho aos vindouros. Uma tarefa que é de todos, tanto mais quanto seja feita para todos.