Despertou-nos
já há tempos a atenção sobre este texto, constante no site da Instituna
de Leiria, no que toca à explicação do traje que escolheram para a sua hierarquia de "Carrega" (leia-se, candidatos a entrar na tuna).
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No site, inserindo "traje" na pesquisa, acede-se ao texto. |
Centremos a nossa atenção nos seguintes parágrafos, em zoom in:
Pouco
haverá a opinar sobre a escolha, senão estranharmos que um traje que merece
tanto respeito evocado, tanta reverência pela tradição que representa, seja
precisamente usado como traje de candidato a caloiro. Há, quanto a nós, neste
ponto, uma precipitada incoerência, acabando por se retirar alguma dignidade a
um histórico traje de Tuna.
Que
é melhor escolha que pijamas, também concordamos.
Escolher
um traje de Tuno para, com mais ou menos adaptação, servir para traje de
candidato a caloiro (ou seja, não é sequer tuno)............... cremos que não
foi decisão muito feliz. Bastaria inverter a coisa e perguntar se não veríamos,
com algumas reservas, a adopção do nosso traje nacional como traje de caloiro
das tunas espanholas.
OS EQUÍVOCOS HISTÓRICOS
Não
se percebe muito bem o que é ir buscar a escolha de peças de vestuário do
actual traje espanhol à origem do fenómeno, quando, na origem, o traje em uso
pelas tunas espanholas nem era sequer o que actualmente conhecemos, e a que o texto do site se refere.
Num
segundo momento, refere o traje dos antigos sopistas e trovadores, como sendo
os usados pelas primeiras tunas, coisas que não corresponde, de todo, aos
factos.
Desde
logo porque o traje que os sopistas utilizavam (capigorrones e boémios manteístas) era composto por peças
totalmente diferenciadas e porque, em segundo lugar, o traje académico espanhol
foi abolido em 1834, juntamente como o foro académico de que gozavam e, por
fim, os sopistas nada têm a ver com Tunas[1].
Por
outro lado, os trovadores são anteriores e pertenciam à nobreza, que se vestia
de modo bem diferente dos estudantes e que, fique claro, nada tinham a ver com
tunas, nem nunca tiveram[2].
Convirá ter presente que nem no tempo dos medievos trovadores, nem no dos sopistas do antigo regime existiam sequer tunas.
Convirá ter presente que nem no tempo dos medievos trovadores, nem no dos sopistas do antigo regime existiam sequer tunas.
Há
aqui, portanto, uma enorme confusão.
Outra
afirmação que é feita é a da existência de tunas espanholas com 200 ou mais
anos, coisa que é totalmente falsa.
Se
existiam formações efémeras a partir da década de 1840, as famosas comparsas que deram depois origem às primitivas estudiantinas, ambas só se formavam no carnaval e logo desapareciam. Em Espanha,
a formação de tunas com cariz mais ou menos permanente só começa a ocorrer no
dobrar do séc. XIX para o XX, sendo que é efectivamente após a guerra civil espanhola, durante a ditadura de Franco, e sob os auspício do S.E.U., que se fundam as mais antigas tunas espanholas que ainda hoje perduram.
As
tunas mais antigas com actividade continuada não são sequer espanholas.
Como
já o esclarecemos em artigo,
"Recordemos que as tunas mais antigas do mundo EM
ACTIVIDADE são todas portuguesas, quer as de cariz popular quer
estudantil, embora também existam fora de Portugal (nomeadamente Bélgica e
França):
1870 - Estudantina - Tuna
Brandoense;
1877 - Tuna Esperança de
Santa Maria de Lamas;
1890 - Tuna Mozelense;
1892 - Estudiantina
Biterroise (França);
1894 - Tuna Académica da
Universidade de Coimbra[3];
1896 - Estudiantina Chalon
(França);
1897 - Tuna de Óis da
Ribeira;
1902 - Tuna Académica do Liceu
de Évora;
1905 - Estudiantina La
Cigale (França);
1910 - Tuna Souselense e
Tuna Musical Brandoense e Tuna de Oleiros;
1911 - Tuna de Tavarede.
1912 - Estudiantina de Mons
(Bélgica);
Em
Espanha ninguém usa traje académico desde 1834. Não existe, portanto.
O
traje de que o artigo fala é um traje de tuna, apenas e só. Não é, portanto, um
traje académico, propriamente dito.
Um
outro reparo:
- O
traje espanhol não possui camisa com brasão.
- A
Beca (também usada por coros universitários) é da cor da faculdade (dos estudos
cursados) e contém o brasão da Tuna (com a heráldica da instituição de ensino)
e não existe nada que determine que o nome seja inscrito com linho.
Recordamos que a beca apenas aparece nas tunas espanholas em finais da década de 1940-50 e só mais tarde ainda a colocação do brasão na mesma.
Quem escreveu o texto parece ter contactado com uma tuna espanhola muito diferente de todas as demais.
Recordamos que a beca apenas aparece nas tunas espanholas em finais da década de 1940-50 e só mais tarde ainda a colocação do brasão na mesma.
Quem escreveu o texto parece ter contactado com uma tuna espanhola muito diferente de todas as demais.
Convidamos a ler o seguinte
artigo, constante no site de Tvnae Mvndi, que explica detalhadamente
a origem e evolução dos trajes usados inicialmente pelas primeiras comparsas estudantis
e estudiantinas, até à chegada da Estudiantina Fígaro e difusão mundial do
traje que foi buscar ao guarda-roupa de um teatro de Madrid, para, depois já bem entrados no séc. XX, se
chegar ao actual traje.
Nada como inteirar-se com
factos devidamente documentados, antes de alinhavar e publicar textos urbi et orbi.
Também
sugerimos a leitura do seguinte livro (e do lado direito do nosso blogue,
apresentamos outras sugestões bibliográficas, algumas também gratuitas), e que, embora em espanhol, poderá ajudar a esclarecer
algumas dúvidas.
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Clique na imagem |
Pretendendo-se
respeitar a Tradição, diríamos que conviria primeiro conhecer e documentar-se sobre a mesma, sob pena de a estar a inventar, passando uma imagem pouco
abonatória de falta de rigor e credibilidade que destoam numa classe de pessoas
letradas.
Já
quanto aos conceitos e regras seculares a que responde a Tuna, referidos pelo texto, perguntamos
quais são, pois, pelo até agora lido, nos parece haver um enorme equívoco aliado
a uma fértil imaginação.
[1] COELHO,
Eduardo, SILVA, Jean-Pierre, TAVARES, Ricardo, SOUSA João Paulo - QVID TVNAE? A Tuna estudantil em Portugal
- Euedito, 2011, pp.46-55.
[2] Idem.
[3] 1888,
para os que alegam que a TAUC é a continuidade da Estudantina de Coimbra, coisa
que, segundo
explicámos, carece ainda de inequívoca prova.
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