O
purismo exacerbado que se verifica noutras geografias tunantes é, pelo menos do
lado de cá da fronteira (cuja tradição tuneril é a mais rica pela diversidade e
historicidade), algo risível e...ridículo.
Uma
honesta investigação à génese das tunas não pode, depois, pretender eleger o
que lhe agrada e omitir os dados históricos que não lhe convêm.
Mas
é precisamente isso que ocorre, com estudiosos cujo trabalho de investigação
se reconhece, mas que, depois, truncam e desvirtuam esses mesmos factos, para
lhes impor uma visão que não tem por base o mesmo rigor histórico que, supostamente,
aplicam no seu labor - antes a sua visão pessoal.
Portanto,
há quem diga que "Tuna" só corresponde a grupos universitários e,
depois, para os demais grupos, afirme que se devem, quando muito, apelidar de
"rondallas" ou, pasme-se, "estudiantinas".
Desde
logo esse raciocínio está equivocado e perverte os factos históricos, quando
sabemos que Tuna e Estudantina são a mesmíssima coisa, sendo que primeiro
surgiram as "estudiantinas" (de estudantes e de não estudantes) e,
depois, surge o termo "Tuna", num esforço para distinguir as "estudiantinas" compostas exclusivamente de estudantes das demais. Em momento
algum se pode afirmar que foi para distinguir grupos civis de grupos universitários,
mas, sim, distinguir apenas grupos civis de grupos estudantis (que podiam ser,
ou não, universitários).
É
isso que os factos históricos dizem: distinguir estudantinas (Tunas) de
estudantes das demais. E estudantes não eram, nem são, apenas e só
universitários.
Portanto,
afirmar-se que só é "Tuna" um grupo universitário é falso.
Tanto
é falso que continuaram a existir quer estudantinas quer tunas a nível popular
(civil), assim como de outros graus de ensino (liceus, principalmente) sendo
que, em alguns casos, algumas são já instituições centenárias, ou seja com
maior legitimidade histórica que qualquer tuna universitária criada seja no
tempo do SEU (Sindicato Español Universitário), seja depois disso. E isso é um
facto histórico que desagrada aos puristas.
É
de uma desonestidade a todos os níveis, essa presunçosa mania de distorcer a
história, para caber em concepções pessoais e
pretender impor uma visão apócrifa de Tuna.
Mas
ainda mais estranho é pretender que outros grupos não universitários não podem/deviam
usar a denominação "Tuna" e que, quando muito, se deveriam chamar de
"estudiantinas". Mas o que são "estudiantinas"?
Em
rigor, são grupos de estudantes. É esse o significado do termo, que depois passa
também a designar as orquestras de estudantes a que mais tarde se chamará de tunas.
Se,
para esses iluminados, só os grupos universitários se podem chamar "Tunas",
então significa que os grupos universitários que se designam
"estudiantina" não são Tuna?
Ou
querem agora vir com a lata de afirmar que os universitários têm o direito de
usar ambas as designações, porque moral e historicamente mais legítimos, e
todos os demais grupos escolares (ou mesmo civis) não?
É
que este raciocínio afunilado e cego quase roça a mesquinhez argumentativa.
E
para o leitor compreender o paradoxo desses iluminados, estes, chegam mesmo a
pretender que só há tunas a partir do SEU (que é quando, segundo eles, se
cristalizam regras e ritos e a tuna ganha como que um formalismo). Ou seja,
enchem páginas a afirmar que a Tuna nasce no séc. XIX (e dizem bem), mas depois
afirmam que só são tunas as que são universitárias e seguem o modelo estilizado a
partir do SEU espanhol (grosso modo, a partir dos anos 1950 em diante).
Ficou
confuso o leitor? Natural, pois é contradição em cima de contradição.
É
como pretender que só há espanhóis a partir do franquismo ou que só há portugueses
depois, por exemplo, da implantação da República.
Discordamos
em absoluto dessa visão redutora e que perverte os factos históricos.
Uma
coisa é haver tunas ou estudantinas universitárias e outra é haver tunas e
estudantinas que o não são.
Para
além disso, aplicar conceitos actuais a factos passados, ignorando contexto e
factos é um exercício falacioso; tal como seria falacioso afirmar-se que só há
tecnologia a partir da revolução industrial ou com a invenção do chip.
Discordamos ainda mais do chauvinismo que pretende elevar o modelo "Tuna del SEU" como paradigma quer para classificar tunas em Espanha quer noutros países, como Portugal.
Discordamos ainda mais do chauvinismo que pretende elevar o modelo "Tuna del SEU" como paradigma quer para classificar tunas em Espanha quer noutros países, como Portugal.
Bem
sabemos que, num purismo estrito, estudantinas e tunas remetem para o cariz
estudantil (e não apenas universitário). Ninguém no seu perfeito juízo pode pôr
em causa isso.
Mas a verdade é que essa intenção denominativa (a de atribuir uma designação exclusiva aos grupos estudantis), iniciada ca. 1870, acabou por não surtir o efeito pretendido e que a criação de grupos, com essa designação, por parte da sociedade civil, ocorreu logo de seguida.
Mas a verdade é que essa intenção denominativa (a de atribuir uma designação exclusiva aos grupos estudantis), iniciada ca. 1870, acabou por não surtir o efeito pretendido e que a criação de grupos, com essa designação, por parte da sociedade civil, ocorreu logo de seguida.
Portanto,
uma coisa é o que gostaríamos que fosse (ou tivesse sido) e outra é o que de
facto aconteceu. E isso não pode ser apagado, porque estamos a falar de mais de
1 século de história.
Além
disso, essa coisa do purismo exacerbado parece ignorar as muitas apropriações
ao meio civil que o foro estudantil preconizou.
A
cegueira e fundamentalismo são tais, que esses mesmos "puristas"
chegam ao supremo desplante chauvinista de considerar que as centenárias tunas
portuguesas não são Tunas. Sim, leram bem: afirmam, por exemplo, que a Tuna Académica do Liceu de Évora (fundada em 1902 e até hoje existente) não é tuna, à luz do conceito "hispano-SEU-Tuneril", segundo critérios truncados e erróneos para, assim, poderem legitimar os seus devaneios
e reescrever a história conforme lhes apraz.
Bem
sabemos que o facto de Portugal possuir a mais longa tradição tuneril
ininterrupta, quer para tunas escolares, universitárias ou populares, provoca
incómodo nesses puristas de meia tigela. E como esse facto é pedra no sapato
que desmonta os seus pés de barro, vai de excluir o caso português, para só
considerar que há tunas em Portugal quando (agora pasmem) se começam a parecer
com as espanholas (a partir da década de 1980).
Ou
seja, a suprema presunção chauvinista de que só há um paradigma tuneril puro e
verdadeiro (o hispano-franquista) e que só se considera tuna o que for parecido ou seguir
o modelo espanhol "criado" a partir do SEU.
Para
azar dos puristas, e usando da mesma medida argumentativa, as tunas mais puras (no sentido de mais perto do modelo
secular e original) são portuguesas, são centenárias. Quem, então, se desviou
da tradição?
Ah,
claro que a tradição também ela se vai renovando e enriquecendo, e é isso mesmo
que Portugal pode igualmente apresentar, pois temos tunas segundo o modelo
original, tal como temos tunas posteriores e, em tempos mais recentes, tunas mais similares às actuais tunas espanholas.
Não faz de umas, em relação às outras, mais ou menos tunas. E é isso que alguns
puristas não conseguem entender - quando por cá foi sempre pacífica a
convivência com a história.
Goste-se
ou não, estudantinas e tunas são grupos que encontramos, desde o séc. XIX, em
vários países pelo mundo fora.
E a
concepção generalizada que foi atribuída a esses grupos (por mais imprecisa que
estivesse nessa época) é que são apelidados de "Estudiantina" ou
"Tuna" em função não dos elementos que compõem esses grupos, mas do
leque instrumental que os caracteriza.
É
isso que a história comprova documentalmente e é exactamente isso que a
musicologia afirma e defende - algo
que esses "puristas" querem abafar, menorizar ou mesmo desconsiderar.
O purismo
que defende que "Tuna" é uma designação que apenas diz respeito a
grupos universitários é uma "visão" de décadas, iniciada a partir
do SEU espanhol, no intuito de dar maior visibilidade e "pedigree" a
esses grupos (daí também ser nessa época que se inventam as origens medievais,
goliardescas e trovadorescas da Tuna - tudo no intuito de conferir um áurea histórica de séculos e uma tradição pura de cariz exclusivamente
universitária). E são exactamente os tunos que foram assim formatados que,
mesmo perante as evidências históricas (apesar de, há já alguns anos, alguns, um
pouco mais sérios, rejeitarem as origens medievais) continuam a ter uma visão
classista e discriminatória de Tuna e, assim, a ignorar o que as evidências
documentais apresentam (ou truncando-lhes o sentido e pertinência ).
Falar
em rigor e metodologia para depois apresentar esse argumentário é decididamente
algo paradoxal.
Mas
ter a presunção de possuir um qualquer ascendente moral para policiar as tunas,
determinando quem é Tuna e quem não é, constitui uma falácia que não se entende.
Uma
coisa é distinguir entre tunas académicas e tunas civis. Uma coisa é perceber
que tunas académicas não são as estritamente universitárias (só um néscio não
percebe que o termo "Académico/a" não é exclusivo de universidade),
mas outra é impor dogmaticamente que só umas e não outras são verdadeiras,
sendo as demais falsas, apócrifas, de contrafacção.
Portanto,
se os puristas querem defender o que é genuíno na Tuna Universitária, então que
se dediquem apenas a isso e se deixem de tratar daquilo que não é de cariz
universitário, respeitando-o e não se achando donos do mundo tvnae, vestindo o
inquisidor papel de "Torquemadas de pacovia", de index em riste,
ditando e determinando do alto da cátedra de barro.
É
que esses tiques ditatoriais chegam depois aos tiques da censura e perseguição,
como se pode ver nesta página (abaixo apresentamos imagem da mesma), criada especialmente para
a "caça às bruxas" e onde se incita à delação. Parece termos recuado aos tempos da "limpieza de la sangre".
E
nem vamos aqui apresentar as desconsiderações que esses "puristas"
fazem acerca da Tuna Portuguesa, para não se promover uma escusada inimizade fratricida entre "hermanos", só por causa de uns quantos que se acham
reis e senhores da res tvnae a nível
mundial e vivem ainda num "franqueirismo bolorento".
Puristas que chegam a criar sites com o intuito único de fazer "caça às bruxas" ou ajustar contas pessoais |
Se
a tradição tuneril não nasceu por cá (embora surja quase de seguida), a verdade
é que a nossa longa tradição (a mais longa em termos de actividade continuada)
tem muito a ensinar a esses fundamentalistas.
Tem, porque foi sempre um fenómeno que conviveu pacificamente com as suas várias
expressões. O que historicamente sempre importou foi diferenciar as tipologias;
as tunas/estudantinas académicas (de estudantes) das demais, para isso bastando
a designação "Académica", "universitária",
"escolar" ou "de liceu".
Sempre
foi aceite (são mais de 100 anos de evidência histórica), como noutros países
sucedia (e sucede ainda), que "Tuna/Estudantina" era historicamente
uma designação de um grupo em função do leque instrumental que o caracterizava.
Nunca
houve necessidade de cercear ou constranger outros grupos pelo uso da
denominação "Tuna/Estudantina" ou procurar impedir ou desconsiderar
tunas/estudantinas não académicas. Para nós bastava, como basta, essa simples
distinção.
A
preocupação natural dos grupos académicos era que fossem académicos; que os
grupos denominados de "universitários" o fossem e que qualquer grupo ostentando a designação "Tuna/Estudantina" possuísse as características históricas desse tipo de agrupamento: o leque instrumental, desde logo.
Não
foi preciso arranjar escusas sobre ritos iniciáticos ou quejandos para servir
de marca distintiva, porque, afinal, em Portugal, e desde o séc. XIX e até à década de 1980 (tal como em Espanha até 1950), tunas e estudantinas académicas não
se definiam pelos ritos (quase inexistentes), como passou a suceder, quando contaminadas
pela Praxe ou pelos ritos importados do país vizinho (ritos esses que nasceram
poucas décadas antes - a partir dos anos 1950 - e não como tradições seculares
como eram "vendidos", ou por cá, romanticamente, interpretados).
Não
são os ritos iniciáticos de definem uma tuna estudantil ou universitária. Se os
estudantes decidirem não os ter é opção que não condiciona que sejam tuna (como
sucedia nas tunas de antanho). Se os estudantes universitários de hoje
prescindirem de ter hierarquia e nomes pomposos, não quiserem ser apadrinhados
(como tantas aliás não o são), fazer geminações ou baptismos de tuna,
preferindo, por exemplo, uma organização mais pragmática (como uma qualquer
orquestra onde apenas imperam critérios musicais), isso não significa que a sua
tuna universitária seja menos tuna.
Não
são os ritos que definem uma tuna como tal. Aliás, desconhece-se alguma
cartilha que seja seguida à risca por todas as tunas eleitas como tal pelos
"puristas". Todas as tunas procedem ao mesmo baptismo (devidamente
regulamentado nas fórmulas e procedimentos, como sucede num baptismo católico)?
Todas seguem rigorosa e escrupulosamente os mesmos critérios hierárquicos e o
mesmo modus faciendi?
Pode
haver uma ideia de algo que é comum e parecido, mas a verdade é que há tantas
nuances como tunas.
O
que é que, contudo, todas as tunas possuem que historicamente as identifica
desde a génese? Os instrumentos que lhes são próprios. E, no caso das tunas
académicas, o traje e pandeireta (instrumento iconográfico das tunas
estudantis).
Vai
já bem longa esta reflexão crítica. Agradece-se, desde já, aos leitores que
chegaram aqui ainda acordados, até porque alguns poderão sentir-se algo fora do
contexto, mas fique o leitor ciente de uma coisa: sabemos distinguir entre
opiniões pessoais e evidências históricas e nunca subordinaremos as segundas em
função das primeiras.
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