quarta-feira, 22 de junho de 2022

Cronologia da Tuna em Guimarães - da década de 1880 à de 1920

Uma rápida passagem, em jeito de cronologia, pelo fenómeno tunante em Guimarães, cidade berço da nacionalidade, durante o que se pode considerar de 1.º boom de tunas em Portugal.

Em 1886, temos a Estudantina de João Maria dos Anjos a actuar no salão da Associação Artística Vimaranense.[1]

No ano de 1888, temos a Tuna Vimaranense a dar serenatas pelas ruas da cidade[2] e a participar no sarau comemorativo do 3.ºaniversário do Club Commercial Vimaranense[3].

Reencontramos a Tuna Vimaranense em 1890, a dar concerto no Teatro D. Afonso Henriques (e vestida de tunos espanhóis) e, depois, a dar serenatas pela cidade [4]; em 1892, nos festejos do Dia de Reis[5]; em 1893, em que se diz que tenciona ir em viagem de recreio à Penha. Finalmente, em 1894, também a encontramos em viagem de recreio[6].

Nesse ano de 1894, temos referência à Tuna Artística Vimaranense, a qual festeja o aniversário da sua instalação com desfile pelas ruas da cidade, serenata e ceia[7] (não se podendo afiançar, com total certeza, tratar-se da Tuna Vimaranense, já citada). Dizer que voltaremos a ter notícia de uma Tuna Artística, mas no ano de 1932[8], bem como, outra, em 1947[9] e 1949.

Nesse mesmo ano, em Dezembro, a Estudantina do Colégio de São Dâmaso actua no dia do seu patrono (dia 11) e, depois (dia 21), sob direção do sr. Martinó, em Sessão Solene da Associação São Luís.[10]

Em 1895, a Estudantina do Colégio de São Dâmaso abrilhanta (a 3 de Março) mais uma Sessão Solene promovida pela Associação São Luís[11] e, em Junho, temos a Tuna dos Cegos de Guimarães nas festas de S. João[12].

Em 1897, temos nova referência à Tuna Vimaranense, dizendo-se da mesma que iria dar concerto a Vila Real[13].

Em 1899, há nova referência à Estudantina do Colégio de S. Dâmaso[14], a qual continua dirigida pelo sr. Martinó[15].

No ano de 1900, a Estudantina [académica[16]] Vimaranense (do colégio S. Dâmaso) participa no cortejo cívico da "Festas Sarmentinas"[17].

Algumas tunas vimaranenses.

Em Março de 1903, temos a Tuna do Círculo Cathólico de S. José e S. Dâmaso, participando das festividades ao patrono da agremiação, S. José[18] e, mais tarde, em Dezembro, temos a Troupe Musical Artística Vimaranense, sob a batuta do sr. Cypriano, a percorrer as ruas da cidade nas comemorações do 1.º de Dezembro[19].

Em Fevereiro de 1904, temos a Tuna do Círculo Cathólico de S. José e S. Dâmaso, no sarau de carnaval promovido por aquela agremiação[20] e, em Março, temos a Tuna da Nova Filarmónica Vimaranense[21], a actuar no final da conferência da Associação de Classe dos Empregados de Comércio de Guimarães[22]. Nesse mesmo ano, em Agosto, a Tuna do Círculo Cathólico Operário participa da romaria à Virgem de Lourdes, na Penha[23]. Para terminar, no mês de Outubro, a dita foi a Vizela, onde percorreu as ruas e tocou no coreto local[24].

Em 1905, a Tuna do Círculo Católico foi cantar os Reis a casa de alguns benfeitores, sendo que a receita originada seria para aquisição da bandeira da tuna e de novos instrumentos[25]. Depois, em Junho, actua nas comemorações do 3.º aniversário daquela instituição[26] e, depois, reencontramo-la, em Dezembro, a actuar na sua sede[27].

Em 1906, temos a Tuna 26 de Janeiro, que se associa aos festejos do 3.º aniversário da Nova Filarmónica Vimaranense[28]. Nesse mesmo ano, em Novembro, a Tuna do Círculo Católico, sob regência do sr. Dantas, actua, na sua sede, na conferência lá realizada, para, em Dezembro,  se associar aos festejos do 1.º de Dezembro, organizados pela academia vimaranense[29] e, depois, dar concerto na sua sede em honra do seu patrono[30].

Em Março de 1907 anuncia-se que em breve estará formada a Tuna Académica, sob regência do sr. Soares (mestre da Banda Regimental de Infantaria 20), tendo já sido composto um hino[31] para a nova tuna pelo sr. Annibal Vasco Leão[32]. Em Abril a Tuna do Círculo Católico participa em sarau, na sede da colectividade[33].

Em 1909, em Maio, temos referência à recepção festiva feita aos excursionistas da Póvoa do Varzim, estando diversas agremiações vimaranenses, entre as quais a dos Empregados de Comércio e a respectiva Tuna (Tuna dos Empregados de Comércio - que, no ano seguinte, mudará de nome).[34]

Em 1910, mais precisamente em Junho, anuncia-se que a Tuna  do Grupo "Por Guimarães", tenciona ir a Fafe, para se dar em concerto no teatro local[35]. Desse mesmo ano há referência à Tuna dos Caixeiros de Guimarães[36].

No ano de 1913, em Dezembro (dia 21), estreia-se a Tuna da Juventude Católica de Guimarães, sob regência do Sr. José Gnise, encerrando uma conferência realizada na sede daquela colectividade[37].

Em Abril de 1914, a Tuna da Juventude Católica actua em sessão solene daquele centro associativo[38]. Mais tarde, em Maio, essa mesma tuna volta a actuar em sessão solene, na sua sede, repetindo-se esse tipo de concertos em Junho (por 2 vezes) e em Dezembro[39].

Em 1915, em Março, a Tuna da Juventude Católica dá concerto, na sua sede, na festa da inauguração e bênção da bandeira daquela agremiação e, depois novo concerto, à noite, no Teatro D. Afonso Henriques[40]. Mais no final desse ano, em Novembro, participa no sarau organizado pelo grupo cénico daquela associação, seguindo-se, dias depois, récita em benefício a Cruz Vermelha de Gondomar, para compra de ambulância[41].

Em Maio de 1916, prevê-se festa do 1.º aniversário do Grupo Cénico da Juventude Católica, com participação da Tuna[42] - a qual, em Junho, actua no Teatro S. Geraldo, em Braga[43], para, no mês seguinte, actuar  no 3.º aniversário da Juventude Católica de Guimarães[44].

Tuna (e grupo cénico) da Juventude Católica de Guimarães (em Braga)
 - Illustração Catholica, Ano IV, N.º 157, de 01 de Julho de 1916, p. 7.

Em Janeiro de 1917, a festa prevista no Teatro D. Afonso Henriques, promovida pela Juventude Católica, foi impedida, com a entrada na sala do vice-presidente da Câmara, José Rodrigues Leite e Silva, acompanhado da polícia, impedindo o espectáculo de continuar, estava a Tuna da Juventude Católica em palco e, prestes a iniciar a sua actuação. O periódico refere o facciosismo e autoritarismo dos republicanos e a suas manifestações anti-clericais[45]. Depois, em Junho, a referida Tuna actua em espectáculo organizado por aquele centro católico[46].

Em 1918, a Tuna da Juventude Católica vai de passeio à Serra da Penha[47].

Em Abril de 1922, voltamos a ter notícia da Tuna da Juventude Católica de Guimarães, actuando em conferência organizada por aquele círculo[48].

 

Tunas vimaranenses

É uma breve cronologia, carente de mais aturados trabalhos de investigação (sobretudo da década de 1920 em diante). Apesar de possuirmos dados posteriores, cremos que, os aqui apresentados,, já permitem ter uma ideia clara que Guimarães também inscreve o seu nome na história tuneril portuguesa.

Não referimos as visitas de várias tunas à cidade, para não alongar, mas Guimarães também foi espaço que acolheu, dentro da cronologia anteriormente apresentada, a visita de inúmeras tunas, especialmente de Braga, Porto e Coimbra.

 

Obviamente que a Tuna de cariz académico surge em Guimarães pela mão de alunos do colégio São Dâmaso. Já os alunos do Liceu, fundado em 1890[49] e confirmado por decreto em  1896, apesar da tentativa de formação de uma tuna em inícios do séc. XX,  parecem não ter conseguido formar um grupo estável. Com efeito, não foi possível, à data, rastrear a Tuna Académica que se iria, supostamente, formar em 1907. Se é que se chegou a formar, terá tido efémera existência (não é referida, por exemplo, nos espectáculos estudantis do 1.º de Dezembro, nos anos de 1907, 1908 ou 1909), mas certamente existirão dados à espera de serem trazidos a lume.

Nota: os dados apresentados foram investigados no âmbito da revisão à obra "Qvid Tvnae?" (com vista a uma nova edição revista e aumentada) e foram coligidos até Maio de 2020.

 

 

Uma referência, já agora, "en passant" sobre a pretensa e errónea ideia de ter havido Ensino Superior em Guimarães, em tempos mais recuados.

Com efeito, encontramos alguns artigos publicados na web[50] que falam do Colégio das Artes e Humanidades da Costa, no séc. XVI, como, porventura, equiparado a Universidade.

Tal é falacioso e carece de prova documental. O dito colégio, como outros que existiam, era, de facto, um espaço de ensino, mas dedicado a clérigos e nobres, mas não se conhece qualquer documento, à data, que demonstre que, em 1539, foi autorizado pelo Papa Paulo III a atribuir os graus de bacharel, licenciado e mestre, com equiparação aos que eram concedidos pela Universidade de Coimbra. Se existem, estranha-se que não sejam devidamente referenciados ou mesmo colocada imagem dessa mesma documentação.

Convirá não se confundir os colégios (Colégio das Hortas, de São Dâmaso, de São Nicolau...) com Estudos Gerais/Universidade. Os estudos preparatórios que as várias instituições de ensino ministravam, e que existiram em Guimarães e pelo país, não se equiparavam aos graus só conferidos pela Universidade de Coimbra, a única em Portugal[51] até 1911. Aliás, os preparatórios serviam precisamente de antecâmara à candidatura à Universidade.

Uma questão que fica em aberto, à espera de dados mais concretos e acompanhados de prova documental.



[8] Referente à Tuna Associação de Socorros Mútuos Artística Vimaranense - Notícias de Guimarães, N.º 47, de 04 de Dezembro de 1932, p. 1.

[9] No Notícias de Guimarães, 16.º Ano, N.º 789, de 16 de Março de 1947, p. 4 e N.º 803, de 22 de Junho de 1947, p. 2, refere-se a Tuna Artística Vimaranense, criada no seio da respectiva Associação Artística, a qual é dirigida pelo sr. José da Costa Pacheco (também presidente da AG da colectividade). Nos artigos, respectivamente, dá-se conta da formação dos corpos sociais e organização interna, bem como da sua estreia, em 28 de Junho, com descriptivo do repertório executado.

[14] Estabelecimento fundado em 1889, e que funcionou no antigo convento da Costa.

[16] No artigo, não se precisa exactamente de que instituição é, pois vai englobada no grupo de Escolas de Guimarães. Intuimos que seja do colégio, já que dirigida por Arlindo Martinó (precisamente o responsável pela Tuna do Colégio de S. Dâmaso).

[21] A Nova Filarmónica foi fundada em 1903.

[31] O qual será efectivamente estreado no sarau estudantil do 1.º de Dezembro, só não sendo claro se o foi pela tuna, pois o periódico não o refere expressamente. Vd. Independente, 7.º Ano, N.º 312, de 23 de Novembro de 1907,  p. 3N.º 313, de 30 de Novembro de 1907, p. 3.

[34] O Comercio da Póvoa do Varzim, Ano VI, N.º 26, de 28 de Maio de 1909, p. 1.

[36] Jornal Flor do Tâmega, de 27 de Novembro de 1910, citado. por Sardinha, 2005,p.66.

[49] Inicialmente como Seminário-Liceu para, em 1911, se tornar Liceu Nacional (com extinção do curso teológico) e, em 1917, se passar a denominar de Liceu Central.

[50] DURAND, Jean-Yves et al - As Festas Nicolinas, em Guimarães: tempo, solenidade e riso. CMG, 2020 e Nicolinos. pt, consultados a 21-06-2022.

[51] Com o parêntesis de Évora.


terça-feira, 21 de junho de 2022

Estudiantina Fígaro na Argentina, em 1892

 Parece consensual, entre os tunólogos, que o ano de 1892 marca o fim da famosa Estudiantina Española Fígaro.

Desse ano, em Abril, temos referência à mesma na Argentina, em Buenos Aires, actuando no Teatro Novedades, segundo periódico local.


The Standard - Buenos Ayres, 31.º Ano, N.º 8876, de 01 de Abril de 1892, p. 2.


Estudiantina Fígaro (imagem) em periódico austríaco, 1878.

 Será, muito provavelmente, a mais antiga imagem que se conhece, à data, da Estudiantina Española Fígaro.

Surge-nos num periódico circulado em Viena (Áustria), em Outubro de 1878.

Kikeriki (Viena, Áustria), N.º 86, de 27 de Outubro de 1878, p. 2.



sexta-feira, 22 de abril de 2022

Notas negativas a trabalho sobre Tunas.

Estranha-se, é o mínimo que se pode dizer, que uma instituição de Ensino Superior publique trabalhos pejados de erros históricos/científicos, mas quando quem os avalia não percebe do assunto, é natural que o devido crivo não exista.

Mesmo não se tratando de uma tese (antes um pequeno quadro que suportou uma apresentação nas  II Jornadas 2022 RaussTuna[1]), não deixa de ser algo merecedor de reparo, sobretudo por parte de quem sabia (autores e organização foram atempadamente alertados) que o conteúdo enfermava erros grosseiros e afirmações falsas.



Vamos, pois, desmontar o conteúdo do resumo do dito "estudo":

1.º  Não, uma Tuna não é um grupo musical formado por estudantes que usam trajes e tocam e cantam melodias académicas.

- Uma Tuna é uma tipologia orquestral, e há tunas civis como académicas. Por isso não apenas não é exclusivo dos estudantes como o usar "trajes" não é definidor de Tuna e muito menos se tocam e cantam melodias académicas (se forem outras melodias não são tuna?).

- Portanto, uma afirmação errónea que inquina tudo o resto.

2.º  Não, a origem das Tunas não remonta ao séc. XIII nem serviam para custear os estudos.

- No séc. XIII e seguintes não existem Tunas. Existe, sim (e a partir do séc. XVI) o hábito de "correr la tuna", ou seja correr atrás de esmola, onde se destacam as figuras apelidadas de pícaros e tunos, ou seja aqueles que se destacavam na arte de enganar e ludubriar as pessoas para obter ganho (normalmente estudantes por serem mais instruídos). De todo o manancial de recursos enganosos, a música quase nunca é mencionada. Muitos destes pedintes eram igualmente sopistas, porque acorriam às sopas caritativas (mas note-se que sopistas não eram só estudantes).

Só no séc. XIX é que surgem as Tunas e inicialmente como "estudiantinas".

3.º O surgimento das tunas em Portugal não data de 1888 em Coimbra. Já havia tunas bem antes disso no nosso território.

-Se não houvesse investigação feita e publicada, ainda se descontava, mas não é o caso.

4.º É falso que as tunas femininas e mistas só apareçam após o 25 de Abril de 1974.

- Está documentada e publicada a existência de tunas femininas e mistas bem antes da implantação da democracia. Alguns casos ocorrem, inclusive, no séc. XIX.

5.º É verdade que o número de estudos e dados existentes sobre tunas constitui uma evidência da importância do fenómeno.

- Seria era importante dar-se ao trabalho de conhecer esses estudos e dados publicados (grande parte de acesso gratuito na net), sobretudo quando o objectivo é falar com rigor sobre o tema.

6.º Mas é falso não existirem ainda muitas informações devidamente organizadas sobre o tema.

- Esta afirmação é incoerente com a anterior. Há estudos e dados, mas não estão devidamente organizados? E quem afirma isso deu-se ao trabalho de se munir de empirismo e falar com conhecimento de causa ou foi mera preguiça em preparar-se melhor? Pesquisar, ler e inteirar-se dá trabalho? Pois dá.

- Há não apenas bibliografia publicada (em português e castelhano) de acesso gratuito, como há espaços informativos (como o grupo FB "Tunas&Tunos", os blogues "Além Tunas" ou "As Minhas Aventuras na Tunolândia", o portal PortugalTunas e as muitas emissões que o dito portal organizou e estão disponíveis no youtube (PortugalTunas TV) - algumas com temas específicos).

7.º Se pretendiam, com o dito "estudo" perceber o n.º de tunas fundadas ao longo do tempo,qual a sua localização, em que região são mais predominantes .... algo no processo ficou esquecido.

- Até à data, apenas a obra Qvot Tvnas repertoriou exaustiva e rigorosamente o n.º de tunas existentes entre 1983 e 2016, tratando as existências por distrito, por género, por ano ... além de explicar quantas tunas eram fundadas, eram extinctas e estavam activas anualmente. Lamentavelmente, parece que não foi tido em conta (apesar de referido na bibliografia) e as afirmações apresentadas sobre este tema carecem de validade, quando feitas "a olho".

8.º Se pretendiam perceber a evolução da tipologia mista face às restantes tipologias e identificar os vários tipos e evolução de repertórios utilizados pelas tunas, nomeadamente a predominância de adaptações face aos originais... também aqui algo falhou.

- Escusa-se aqui voltar a referir as obras de investigação publicadas, os blogues, páginas de FB (algumas associadas a esses blogues) e portal que contêm informação sobre o tema. Estão disponíveis para consulta. Quem pesquisa sobre o tema teria forçosamente que ir parar a essas fontes (e, com verticalidade, ler as mesmas).

- Não se pode pretender um estudo sobre as tunas a partir do empirismo e experiência vivida na sua própria tuna. Essa sinédoque (tomar a parte pelo todo) resultará forçosa e inexoravelmente a conclusões erróneas.

9.º Afirmar que pareceu relevante realizar um estudo exploratório com recurso ao levantamento bibliográfico existente sobre o tema... é, no mínimo, paradoxal.

- Que levantamento bibliográfico foi feito? Que obras foram consultadas? Não basta citar 2 obras na bibliografia, sobretudo quando o que ela contém diz precisamente o contrário do que é afirmado neste dito "estudo" (o que é grave porque ou as pessoas não sabem ler/interpretar o que se lá diz ou deturparam propositadamente o conteúdo). Por outro lado, outras obras há (em português, nomeadamente) que foram inadvertidamente esquecidas (ou preteridas por excesso de pressa e facilitismo), a par das informações veiculadas em emissões do PortugalTunas ou nos blogues dedicados à investigação tuneril. É que há artigos/emissões que tratam especificamente os assuntos que o pretenso "estudo" quis abordar.

10.º Referir que há um aumento da tipologia mista face às restantes e a existência de uma relação de igualdade face ao repertório de originais e adaptações de música... é mais uma falácia.

    -Como foi dito, não basta referir o nome de obras na bibliografia, se o que elas dizem não é nhonestamente plasmado. Onde é que na obra Qvot Tvnas se afirma que há um crescimento das tunas mistas face às demais e relativamente a que época cronológica?

O que a obra refere é que, a partir de 1997, as tunas femininas pasam a ser mais que as mistas, tendência que voltará a inverter-se em 2015. Não se fala em masculinas nessa comparação. Com que base credível se afirma que as mistas crescem em relação a todas as demais? Com que dados posteriores a 2016, recolhidos e tratados de forma rigorosa, justificam o que afirmam? Fizeram esse trabalho de repertoriação das tunas desde 2016 até 2022 ou é a "olhómetro"? É que não há dados posteriores a 2016 que permitam fazer essa leitura peremptória.

  - Baseados em que dados se afirma haver relação igualdade/paridade entre originais e adaptações/covers? Estão a falar exactamente de quê? Da sua legitimidade ou da sua expressão numérica (resultante de dados recolhidos de um estudo exaustivo a todos os     repertórios das tunas portuguesas)? É que se for em termos numéricos, ainda é pior a emenda que o soneto, já que nem o MFT (Museu Fonográfico Tuneril) fez esse levantamento na discografia (quanto mais no repertório tocado ao vivo).

11.º Afirmar que que os professores e investigadores portugueses deixam normalmente o mundo tuneril em segundo plano é dúbio.

- Se falamos das instituições académicas, é verdade que as tunas são ainda muito postas de lado (embora já haja evolução[2]) como cerne de trabalhos e teses.

- Se falamos em investigadores "tout court" é falso, pois há investigadores e trabalhos publicados que têm servido, nomeadamente, como fonte para trabalhos de mestrado e doutoramento em Portugal e no estrangeiro.

- Claro está que não há ainda um corpus académico devidamente especializado no assunto, razão pela qual vários trabalhos académicos (teses e afins) que usam a Tuna como pretexto para desenvolver teses sobre assuntos diversos estejam pejados de erros grosseiros que descredibilizam quem os faz e quem os avalia. Que avaliação deveria dar-se a um qualquer trabalho/artigo sobre, pro exemplo, regimes políticos em Portugal, começasse por afirmar que a República Portuguesa foi instaurada no tempo dos cartagineses ou que Viriato foi o 1.º presidente de Portugal? Pois......

 

Em suma: quando nos propomos a tratar seriamente um tema com vista a ser publicado (sobretudo no âmbito de uma instituição de ensino), procuramos rigor e excelência. Em tempo algum se permitiria que fosse partilhado sabendo, de antemão, que continham erros dolosos. Por outro lado, submeter a revisão prévia de algum investigador na área (que não são assim tantos nem desconhecidos/inacessíveis), poderia ter permitido uma apresentação isenta de tantas falhas históricas/científicas.

Não foi por falta de ferramentas disponíveis que o dito "estudo" padece de falta de rigor e qualidade académica, nem foi por falta de aviso que foi publicado (sem posterior revisão/correcção), como se digno de crédito estivesse revestido.


Mais haveria a pontar a muitos temas e apresentações ocorridas nessas jornadas, enfermando a mesma carência de rigor, mas que não foram publicadas (e ainda bem).

 



[1] Realizadas entre 11 e 13 de Março de 2022. A apresentação em causa está disponível no youtube em https://www.youtube.com/watch?v=CMvTV1GkdZQhttps://www.youtube.com/watch?v=CMvTV1GkdZQ%20 (min 1:05:13 até 1:18:53).

[2] Na Univ. de Aveiro, já há tese de doutoramento sobre o tema e o Dept.º de musicologia já lhe dá atenção (vd. projecto mpart - Música participada).

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Quando o rigor bateu o pé à mediocridade

Vamos recordar um episódio em torno de um texto publicado que foi centro de uma, então, badalada polémica e que, de certa forma, marcou o início de uma clara diferenciação entre investigação séria e isenta, e aquela que está ao serviço de concepções ideológicas. 

O texto em causa  foi originalmente urdido em 2012[1], pelo Eduardo Coelho, com o objectivo de, resumidamente, dar a conhecer a Tuna Portuguesa à comunidade hispano-americana. Quando, em Outubro de 2016 (ainda éramos colaboradores de Tvnae Mvndi), o texto foi publicado, então com uma actualização de dados feita por mim, no site de Tvnae Mvndi (em resultado da colaboração que os investigadores portugueses já lhe vinham a prestar[2]), surgiu a celeuma.

Com efeito, qual não foi o nosso espanto, ao verificarmos que o texto tinha sido "revisto", sendo que o Sr. Félix O. Martín Sárraga decidira, à revelia, introduzir-lhe dados seus, referências suas (alterando o texto original, portanto) e, pior de tudo, inserir dados sobre tunas portuguesas que careciam de prova e confirmação.

Apoiado no pseudo Censo Mundial de Tunas, de Tvnae Mvndi (2012), avançou, em texto alheio, que existiam, à data, 339 tunas em Portugal (censo que, originalmente, até refere 340), sendo 84 delas tunas do Porto.


São dados que nem eu nem o Eduardo, nem os investigadores portugueses, fornecemos, pelo que ficámos espantados, curiosos e ... desconfiados.

Quando pedimos para sermos elucidados (como é lógico entre pessoas que colaboravam), escusou-se prestar esclarecimentos, recusou fornecer explicações, alegando que não podia partilhar dados, por estarem sob sigilo: porque a lei não permitia partilhar a lista de tunas com que ele chegou aos números avançados.


O problema agudizou-se porque, nessa altura, a associação Tvnae Mvndi[3] tinha um protocolo com o PortugalTunas(que também realizara um Censo em Portugal, em 2013), celebrado em 2015. Quando o PortugalTunas, face aos dados avançados, também pediu dados, para conferir os números do dito censo... veio igual recusa, veio igual argumento falacioso (porque a lei, nem cá nem em Espanha proíbe a partilha de simples listas de existências) e as mais esfarrapadas justificações (motivando a denúncia do acordo entre as partes).

Deu-se, nessa altura, a cisão entre os investigadores portugueses e a dita associação.

Obviamente que foi essa a questão que levou a que fosse empreendido o criterioso e rigoroso trabalho de investigação histórica que se traduziu no 1.º Censo tuneril português de existências, ou seja, saber exactamente quantas tunas académicas existiram, a cada ano (de que tipo, onde...), entre 1983 e 2016, e que surgiu, como livro, em 2019: QVOT TVNAS.

O QVOT TVNAS veio clara e cabalmente demonstrar que o dito "Censo Mundial de Tunas", de Tvnae Mvndi, não tinha qualquer rigor ou credibilidade, quanto aos números apresentados sobre Portugal, deixando evidente que a metodologia usada, a ser a mesma para os demais países, só podia desacreditar todo o seu conteúdo e o respectivo autor. Sobre isso, aliás, se chegou aqui a escrever.

Obviamente que o epílogo se deu poucos anos mais tarde, com os mais reputados investigadores hispano-americanos a deixarem de colaborar com a dita associação[4], retirando-lhe a base sobre a qual também procurou construir a sua imagem[5]; reputados investigadores em clara colisão com a ideologia que usava critérios metodológicos contrários às boas práticas que a investigação histórica rigorosa, isenta e credível exige, pretendendo impor, urbi et orbi, um conceito e definição de "Tuna" contrários às evidências documentadas.

Já António Aleixo dizia:

P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.

Há, pois, que ter ainda mais cuidados, quando alguns investigadores polvilham o que, à partida, são boas investigações, mas as contaminam com ideologias pessoais (deturpando, omitindo e lapidando os factos e dados obtidos, de modo a justificarem a sua própria narrativa).

Aos ombros de gigantes, alguns aparentam grandeza, mas os pés de barro denunciam a estatueta.



[1] Publicado nos blogues Notas & Melodias e Além Tunas e serviu, depois, de base para as conferências a+resentadas durante o II Congreso Iberoamericano de Tunas, em Múrcia, 2014.

[2] Com vários artigos e troca de dados e informações.

[3] Associação composta, na prática, por apenas 2 sócios efectivos e por uns quantos sócios honorários.

[4] Formando hoje a AHT (Academia de História da Tuna).

[5] Aos ombros de gigantes, com efeito, qualquer um parece alto.

terça-feira, 15 de março de 2022

150.º Aniversário da Tuna Musical Brandoense

 Será a mais antiga tuna em actividade a nível mundial. Festeja 150 anos de existência e merece destaque.

Fundada em 1870 sob a designação de Estudantina Brandoense (mudando o nome para "Tuna" em inícios do séc. XX), o seu legado perpetua-se, desde 1980, sob a denominação de Academia de Música de Paços de Brandão.





Uma enorme salva de palmas por este século e meio de actividade.