domingo, 18 de abril de 2010

Pseudo-sapientes a falar de tunas

Não sei se ria ou se chore, perante a atitude de certos pseudo-sapientes que acham que o saber se fundamenta no "parece-me" ou no "acho que". Quando a presunção incauta e irresponsável assenta na falta de estudo sério, obviamente que o resultado é o que se vê (ou lê, neste caso).

Bem sabemos que a Wikipédia é uma fonte falível de informação. Tanto lá encontramos informação credível como textos repletos de erros, dado que o seu conteúdo deriva da participação dos utilizadores. A falta de uma política de revisão séria dos conteúdos colocados e a de colaboradores/administradores que possuam formação nas áreas abordadas leva-nos a olhar para esta "fonte" com extremos cuidados. Parece que o mesmo se pode dizer de certas Wiki páginas, como é o caso da que é alvo deste reparo da nossa parte.

É pois na Wikipágina da Univ. Fernando Pessoa que se encontra o artigo em causa:
http://cmultimedia.ufp.pt/index.php/M%C3%BAsica_Popular, o qual se apresenta sob o título "Música Popular".

É datado de 2007 e escrito por um tal Carlos Cardoso.


De salientar que o texto faz parte de um conjunto mais vasto de produções, sob o título "Tradições Académicas", artigos produzidos na disciplina de Comunicação Multimédia no ano lectivo 2007-08. Também neles se verificam os mesmos erros a atitudes inqualificáveis de ignorância e incompetência, mas que escusamos, por hora, esmiuçar (lamenta-se, isso sim, a publicação de trabalhos com tão pouco rigor e perguntamos que critérios avaliativos presidem aos mesmos).

Classificar o conteúdo do artigo não é tarefa fácil, se quisermos manter alguma ecologia intelectual, mas não é menos verdade que não deixa de nos dar volta ao fígado a sucessão de palermices, roçando a estupidez.
De seguida, um breve olhar sobre o conteúdo:


"Música Popular
A Música Popular é muito utilizada pelas tunas hoje em dia, devido ao facto de a geração de hoje ter como gosto o género musical alternativo. Considera-se Música Popular Alternativa a música de bandas ou artistas portugueses contemporâneos, intérpretes mas principalmente autores de temas originais, da área da música popular ou tradicional, mas com pouco reconhecimento comercial e mediático, e cujas vendas se verificam sobretudo no formato "cassete". Consideram-se ainda como parâmetros para esta classificação, a exposição mediática principal ao nível das rádios locais e as actuações ao vivo condicionadas ao formato de baile.
A Música popular é a música feita pelo povo, fazendo parte das suas raízes históricas. É a evolução natural, na era da globalização, da anteriormente chamada música folclórica, que seria a música de um povo transmitida ao longo das gerações. "



Esta explicação é de deixar a boca aberta. Mais ainda esta classificação de Música Popular Alternativa. Não sei onde se desencantou essa nova teoria, mas não a encontro em nenhuma obra de referência da musicologia ou etnomusicologia. O argumento comercial do reconhecimento e exposição mediática é tão ridículo que só pode ser trailer de uma tragicomédia. A própria definição de Música Popular deixa muito a desejar.
Quem não sabe deveria ter o bom-senso de se documentar, antes de se armar em sabichão.
Lastimável!



"O Nascimento da Música Popular
O nascimento da musica popular deu-se durante o ducado de Guillaume IX d`Anquitaine, o avô de Eleanor, surgiu por inspiração dele uma classe de poetas líricos e músicos chamados de “Trovadores”. Esta nova maneira de fazer música, contrariava profundamente a maneira tradicional dos compositores da época para os quais a música e a poesia deviam só ser escritas para Deus, sobre deus e só em latim. O louvor uníssono à deus, estava rompido, tanto no tema como na linguagem. Por esta razão e por ter fama de mulherengo, foi excomungado pelo Papa. Seguindo essa inspiração familiar vivenciada pelo seu avô e pelo seu pai, Eleanor foi o elemento de difusão da nova maneira de fazer música para o povo, que falava de amor e da natureza , na lingua deles. Enquanto durou o casamento com Louis VII, ela continuou a apoiar os Trovadores, recebendo-os na Corte de França.
Esta nova música que era de alguma forma revolucionária para os padrões franceses da época, começou imediatamente a ser aceita pelo povo. Eleanor ajudava financeiramente os jovens artistas, procurando agradar os nobres que os recebessem em qualquer cidade da Europa onde fossem. Foi nesta época que surgiram os músicos viajantes, que cantavam em troca de alimento e pousada, em busca de possíveis patronos. Quando esteve casada com Henry II da Inglaterra não perdeu tempo em traduzir a nova maneira de cantar o amor cortesão, estimulando novas criações da língua bretã. Novamente o sucesso foi instantâneo, tanto na nobreza como nas classes mais populares da sociedade. Os filhos de Eleanor e Henry Iinão só cantavam temas dos trovadores como compunham pequenas peças musicais. Nesse particular, destaca-se o Príncipe Richard. Todos os trovadores que passavam pelo reinado eram convidados a cantar na Corte, inclusive o famoso Bernart de Ventadorn. Apesar se eleanor nunca ter tocado qualquer instrumento musical e nem se ter notícia de qualquer composição feita por ela, foi uma das mais importantes personagens musicais de toda a Idade média e da música no Ocidente. Sem o seu interesse e empenho em patrocinar a música e as artes de uma maneira geral, a música popular seria certamente bem diferente nos dias actuais. Eleanor colocou a música nas mãos de pessoas comuns, permitindo-lhes expressar seus sentimentos e temas que eram importantes para as suas vidas. "



Ora começamos já com uma contradição com o anteriormente dito. Se a música popular deriva da produção espontânea do povo (que reproduz, adapta, cria corruptelas, etc.), como é possível que ela nasça de forma tão individualizada, por mão de um(a) iluminado/a que, depois, serviu de modelo ao resto do mundo?

Depois fala-se em "nova música, revolucionária para os padrões da época", como se, antes disso, o povo não cantasse, tocasse e criasse, mas só estivesse restrito a música religiosa. Mais ainda, e aí a estupidez ganha contornos de acefalia aguda, pretende-se dar a entender que a música popular é um formato, uma tipologia devidamente demarcada que é exportada de França, que é copiada e se dissemina pela Europa fora.
Gostava, contudo, que esse tal sabichão que escreve estas patranhas, me esclarecesse sobre o tipo de música dessa época, o tipo de composição literária e me desse exemplos disso mesmo, nomeadamente quando aplicado a tunas.

Parece-me que não percebeu bem, isso sim, os conceitos de música profana e litúrgica, e muito menos é versado no estudo das formas musicais e literárias medievas, mas, contudo, avança com estes teoremas ficcionados.
Depois, mistura música popular e trovadores, num claro exercício de ignorância, de quem não conhece os conceitos de música erudita em contraponto com as composições profanas (muitas delas, num primeiro tempo, corruptelas de composições sacras) e as hierarquias e códigos sociais/culturais da época.

E vai, assim, de fazer de Eleanor a patrona da música popular, a que a coloca nas mãos das pessoas comuns. Faz lembrar a Raínha Santa, com as rosas - só que Santa Isabel era santa e não consta que conhecesse tunas (nem ela, nem ninguém nessa altura).
Haja paciência, para tamanha falta de decoro intelectual.



"A origem da Música Popular nas Tunas
A origem da Música Popular nas Tunas terá acontecido no ano de 1212, em Espanha, surgido o primeiro "Studium Generale" que seria o antecessor das actuais Universidades. Pouco tempo depois, D. Diniz manda construir os Estudos Gerais de Lisboa (1285) que, devido a diversos problemas entre a população e os estudantes foram transferidos pouco depois para Coimbra - surgindo a primeira Universidade Portuguesa (com esta designação). Aos Estudos Gerais que foram sendo criados acediam jovens de todo o país e mesmo de outros países vizinhos. Assim surgem, em Espanha, os Sopistas, predecessores dos actuais Tunos. Os Sopistas eram estudantes pobres que, com as suas músicas, simpatia e brincadeiras percorriam casas nobres, conventos, ruas e praças em troca, muitas vezes, de um prato de sopa (daí o seu nome - sopistas) ou de uma moeda que os ajudasse a custear os estudos. Quando caía a noite e tocavam os sinos de recolha cantavam serenatas às donzelas que queriam conquistar, sendo, muitas vezes, perseguidos pelas policias universitárias (visto que o recolher era obrigatório para os estudantes). Daí que os sopistas começaram a utilizar longas capas negras para, na noite escura, se poderem esconder dos polícias. Os Sopistas, eram conhecidos por transportarem sempre consigo um garfo e uma colher de madeira, o que lhes permitia comer em qualquer lado. Assim, quando se formaram as primeiras Tunas, ainda com muitas tradições sopistas, os símbolos adoptados (essencialmente em Espanha) foram, justamente a colher e o garfo de madeira. "



Depois de ler, atentamente, este parágrafo, acabo na mesma como o comecei: sem saber, afinal, qual a origem da música popular nas tunas, porque tal não é respondido.
O que li foi uma inócua tentativa de fazer uma diegese genealógica de sopistas e tunos, numa sucessão de erros e falsidades uma vez mais derivados do copy-paste sem critério; de muita informação errónea e equivocada, que pulula na net: as tais estórias da carochinha que todos professam dogmaticamente sem procurar, sequer, verificar da sua validade.
Começava por relembrar que, no caso de Portugal, é o Papa Nicolau IV que, através da Bula STATU REGNI PORTUCALIAE (1290), confere, então, a Lisboa o tão ansiado estudo geral, sendo nesse mesmo ano confirmado o estudo, em Carta promulgada por El- Rei D. Dinis: “ Dada em Leiria a 1 de Março. Por mandado d´El - Rei a notou Afonso Martim. Era de 1328.” (1290).
Quanto à música popular e às tunas, dizer que, no séc. XIII, não existem tunas, muito menos sopistas, e muito menos tunos. Seja como for, gostava que o douto autor do texto me esclarecesse da tipologia e características dos temas interpretados por esses sopistas e tunos, já agora. Sobre estas "histórias" que não passam de contos, leia-se "A Aventura das 5 Mentiras Tunantes Nacionais" ou ainda "600 Anos de Pseudo-Tradição Tunante".
Parece-me que, afinal, tem o literato Carlos Cardoso muito pouca propriedade em matéria de musicologia, etnomusicologia e tunologia e que ainda vive dos expedientes fixados no mito e nas estórias ficcionadas. Sugeria que ponderasse pesquisa de literatura especializada para uma profiláctica reflexão crítica.

Quanto à explicação sobre o uso das longas capas, mais uma vez estamos perante a imaginação fértil da iliteracia, o ficcionar do "ouvi dizer" (já era hora de sair do país do faz de conta). Não sei onde foi buscar essa teoria. Se está no direito de inventar, pelo menos que o faça de forma plausível. Sobre o assunto, sugiro a leitura do artigo Notas de Cor sobre a Capa e Batina.
Seja como for, parece-me lamentável que os leitores sejam induzidos em erro, ao "prometer-se-lhes" esclarecer da origem da música popular nas tunas e, depois, nada explique ou ilustre, nada exponha de tangível. Por uma questão pedagógica, e para desfazer qualquer equívoco sobre essa errada teoria de ligar tunas e música popular, sugeria a leitura do artigo "A Aventura do Mito Popular".
"O Aparecimento das Primeiras Tunas


A primeira Tuna formou-se em Coimbra, a partir da visita da Tuna de Santiago de Compostela e depois da Tuna de Salamanca e foi chamada Tuna Académica de Coimbra ou Estudantina Universitária de Coimbra."



Ora, aqui, estava à espera de algo mais do que citar, apenas, a Estudantina de Coimbra, já que o título diz falar das primeiras tunas. Não tem mais tunas para apresentar?
Desde já, fique o omnisciente Carlos Cardoso seguro que a Estudantina de Coimbra (só anos depois, adopta o nome de TAUC e resta por provar inequivocamente que se trata do mesmíssimo grupo) não é a primeira tuna em Portugal, mas sim a primeira a nascer em âmbito universitário, mesmo se não era composta, exclusivamente, por estudantes da U.C. (um dos motivos que leva a estudantina a extinguir-se em 1891).
Por outro lado, a Estudantina de Coimbra nasce em resposta à vista da Tuna Compostelana, e não de Salamanca (lamentável a falta de precisão histórica!).
Para quem tem a veleidade e presunção de publicar na Wiki página da sua instituição de ensino, seria bom que estudasse melhor a lição (e que quem coordenou o trabalho dessa disciplina fizesse outro tanto). Nem todos são papalvos que fazem do copy-paste e da mediocridade intelectual a sua metodologia; nem todos assobiam pró lado quando lhes atiram arreia para os olhos.
"Exemplos

A caminho de Viseu
Indo eu, indo eu,
A caminho de Viseu, [Bis] 


Encontrei o meu amor,
Ai Jesus, que lá vou eu! [Bis] 


[Refrão]
Ora zus, truz, truz,
Ora zás, trás, trás,
Ora chega, chega, chega,
Ora arreda lá pr’a trás! 


Indo eu, indo eu,
A caminho de Viseu,
Escorreguei, torci um pé,
Ai que tanto me doeu! 


[Refrão]
Vindo eu, vindo eu,
Da cidade de Viseu,
Deixei lá o meu amor,
O que bem me aborreceu! 


Letra e música: popular; (canção infantil, canção de roda) "



Ora, só podia o artigo terminar com "chave de ouro", com a "pièce de résistance".
O tema popular "Indo Eu a Caminho de Viseu" (que o autor chama de "A Caminho de Viseu") é escolhido como paradigma da música popular nas tunas. 
Só não percebi se o é desde o séc. XIII. Pode dizer o grande académico Carlos Cardoso de quando é datado, aproximadamente, o tema?

Que eu saiba, só as tunas viseenses têm por costume cantar esta canção e, com excepção da Infantuna que, recentemente, lhe fez um belíssimo arranjo - pela mão do Dionísio V. Maior- e incluiu no seu reportório, sempre foi entoado de modo informal.

Que outras de fora o cantassem, sempre que rumavam Viseu, é natural, mas daí a fazer do tema ícone popular nas tunas...... parece-me claramente exagerado. Além disso, Tunas, em Viseu (exceptuando o caso da Estudantina Viseense de 1895 - que não consta que o tocasse ou cantasse, pois nem se sabe se o tema já existiria na altura), só há 2 décadas, pelo que não percebo esta infeliz escolha.


CONCLUINDO


Se a intenção era falar de Música Popular, não vejo, nem percebo, a inclusão de Tunas (pelo menos sem sem estabelecer uma ligação a tinas populares, cujo repertório, ainda assim, era bem mais lato).

Quando muito, poderia dizer-se que também as tunas incorporam no seu repertório música popular. Agora, colocá-las como expressão da mesma é lacunar e errado. Se o artigo é sobre Música Popular, onde estão as referências rurais e urbanas, os grupos, os instrumentos, as características, as tipologias musicais?

Se a intenção era falar sobre a Música Popular nas Tunas, não se percebe o título do artigo (Música Popular), além de que não explica coisa alguma.
Se o pretendido era falar sobre Tunas, errou completamente a tabuleta!

O facto é que nem faz uma coisa nem outra e o que faz é coisa nenhuma!
É lamentável, e vergonhoso até, que estudantes do Ensino Superior passem esta imagem de medíocre falta de rigor e saber. É isso que aprendem na faculdade? Duvido (e, por isso pergunto-me como chegaram ao Ensino Superior), mesmo se algum ônus da culpa recaia sobre quem coordenou esse trabalho no ãmbito da dita disciplina de comunicação multimédia.

Ao que tudo indica, o autor, Carlos Cardoso, não só empalidece a imagem dos alunos da Univ. Fernando Pessoa, instituição que merece todo o respeito - algo que o pseudo-sapiente não teve em conta - mas do estudante em geral, e do tuno em particular.

Ao que parece, estudante (ou ex-aluno) em comunicação multimédia, estou seguro que terá contrato num qualquer órgão de comunicação social sensacionalista.
Termino o artigo pedindo, desde já, desculpa, pelo tom acertivo impresso nesta intervenção, mas, actualmente, com os meios informativos disponíveis, quando se trata de pessoas supostamente letradas, quando se trata de promover a excelência e o rigor sobre uma cultura e história que todos deveriam conhecer melhor - a Tuna (de que fazem, ou dizem fazer, parte), já farta ver tanta palermice e falta de exigência académica e científica.


Que já exista o mau hábito de ler sites de tunas com patetices deste género é uma coisa, mas fazer disso facto credível com direitos de publicação numa Wikipédia de uma consagrada Instituição de Ensino..................

Ninguém está isento do erro (até porque a verdade pode ser sempre contradita por novas descobertas investigadas), mas haja o bom-senso de, ao escrever, fazer o esforço por estudar, investigar e documentar-se (e confrontar fontes) o melhor possível, de modo a que, mesmo passível de erro ou correcção futura, se mantenha a idoneidade e credibilidade de quem escreve.

Neste caso, não me parece desculpável que, existindo dados credíveis e acessíveis, se cometam tantas argoladas.

Quem não sabe pergunta e "quem não tem competência não se estabelece!".

quarta-feira, 14 de abril de 2010

CoSaGaPe em Viseu

Após um bom almoço, como o são todas as refeições em Viseu, rumámos a minha casa para acertar questões várias.
Fazer um livro a 4 desidrata.





domingo, 28 de março de 2010

No VIII Estudantino


Gostei. Um bom ambiente e rever muitos amigos.

















domingo, 7 de março de 2010

Tunas, Bandeira(s) / Estandarte(s)

Assunto bastante esmiuçado no fórum do PortugalTunas, ainda não tinha sobre ele discorrido neste espaço. Assim sendo, cá vão uns considerandos.


Todos estão familiarizados com a nova moda de bandeiras a metro e a rebaldaria que se verifica na hora de destrinçar o que é estandarte/bandeira da Tuna dos pseudo-estandartes e pseudo-bandeiras com que nos prendam certas tunas em palco.

A confusão é natural, dado que, demasiadas vezes, a catadupa e quantidade de panos a esvoaçar nos coloca a difícil tarefa de perceber onde está o estandarte (ou bandeira) oficial da Tuna e onde começa o circo.

O Estandarte ou Bandeira da Tuna é só um(a). Sempre assim o foi, historicamente.
Esse símbolo sempre foi tido como o mais importante de cada agremiação (e não só em tunas), merecedor de toda a reverência e respeito.
Antigamente, nomeadamente nas tunas do séc. XIX e XX (até ao boom), o estandarte da Tuna existia como sinal maior e congregador. Com efeito, era nele que se colocavam fitas de homenagem, de reconhecimento e agradecimento (um pouco como ainda vemos no caso dos ranchos).

Ao estandarte se prestava como que um culto de respeito e orgulho, estimando-o e adulando o seu valor representativo, aliás como sempre foi tradição, ao longo da história, com as bandeiras (fossem elas nacionais, de regimento, corporação etc.).
Nos campos de batalha, contava-se vitória pelo n.º de estandartes retirados ao inimigo, daí que a protecção à bandeira era alvo dos maiores cuidados - o mesmo se passando na conquistas de praças fortificadas ou cidades: a conquista do estandarte inimigo significava a derrota ou capitulação do mesmo.

Hoje em dia, parece que esse reconhecimento e valoração passou para 2.º plano.

Este fim de semana assisti à actuação de uma tuna de que registei o seguinte:

1º Apresentava diversas bandeiras do seu município, com as quais fez os malabarismos costumeiros (ficando algumas no chão, enquanto as demais estavam a rodopiar);
2º Das bandeiras apresentadas, uma era, pasme-se, da Junta de Freguesia;
3º Algumas bandeiras do município, artilhadas com efeitos pirotécnicos, apresentavam-se rotas, com buracos de queimaduras que mais não traduzem  que a falta de respeito perante um símbolo que, não sendo da Tuna, merece ainda maior respeito pela natureza do mesmo. Uma bandeira é para ser estimada e não assim vulgarizada e reduzida a adereço cénico de qualquer show de saltimbancos;
4º Depois, apareceram as "bandeiras de sinalização", um subtipo de bandeira (configuradas em bandeira de mão) sem qualquer logótipo ou desenho identificativo, meros panos de cor. Neste caso, eram 4, duas em cada mão. Pensei estar a tratar-se da aterragem de algum avião ou antigo método de comunicação medieval;
5º, e não menos importante, a dita Tuna não apresentava nenhum estandarte ou bandeira da Tuna.

Com isto dizer que seria bom que as tunas não confundissem circo e tunas. Nos tempo sidos, os espectáculos das tunas comportavam representações dramáticas, declamação de poemas, solos musicais, fados, a par com a própria parte orquestral (da tuna propriamente dita), mas não consta que houvesse número de circo, malabarismos e "bandeiradas".

Tradicionalmente, o estandarte não era para ser bailado, até pela reverência e importância do mesmo. Mais tarde, com o precedente criado, e copiado, do país vizinho, emanado dos tempos do S.E.U. (Sindicato Universitário Espanhol), começaram os estandartes DE TUNA a serem bailados ou, então, a aparecer uma bandeira com o logótipo da tuna, propositadamente feita para ser bailada - assumindo-se "versão bailável" do próprio estandarte (o qual ficava quietinho, continuando a assumir o seu papel de sempre - e bem - de identificar e representar a Tuna).

Não eram nem 2, nem 3 nem 4 bandeiras. Não se clonavam bandeiras para obedecer a meras lógicas de espectáculo cénico, ele próprio subordinado à lógica do "vale tudo" para se conseguir um prémio (e recordamos a "festivalite aguda" que descaracterizou e travestiu muito boa tuna neste país).

É de perguntar onde está a coerência destas "bandeiradas". Onde está o nexo de uma tuna, neste caso, não se apresentar sequer com o seu próprio estandarte ou bandeira, mas empregar outras, as quais apresenta em estado lastimável e, pior ainda, apresentando bandeirolas, lembrando aquela versão olímpica da ginástica rítmica com fitas.

Não vou entrar em moralismos quanto ao uso, nem sempre feito com critério, de bandeiras de município (ou mesmo da bandeira nacional), embora me pareça que muitas vezes se acaba por vulgarizar a importância desse símbolo, transformado em mero adereço cénico (pessoalmente, creio ser abuso brincar com tais símbolos).

Já o que acho sem nexo algum é a dança de bandeiras, que, na verdade, nem bandeiras são (porque não representam nada, não são bandeira de nada), não passam de meros panos de cor. E muito menos percebo que qualquer jurado considere e avalie tal.
E quando, num mesmo espectáculo, bailam, alternada ou concomitantemente, bandeiras de município, bandeira nacional, bandeira de tuna............ não apenas se promove a confusão como se equipara tudo por uma bitola pouco consentânea, onde o valor de um paninho a esvoaçar tem a mesmíssima valoração  de uma  bandeira/estandarte da tuna (com a sua heráldica, significado e simbologia).


Demasiado show-off é o que temos, ao qual se soma o bailar da capa, à moda tauromáquica (modalidade sem qualquer fundamento histórico ou lógico em Tunas - qualquer dia bailam batinas ou temos número de sapateado), perguntando-me o que se ganha com isso senão o destrato de uma peça que merecia outro respeito.

Nada contra o bailar do estandarte/bandeira da Tuna (conquanto não se deixe cair ou se arrume no chão), porque, com graciosidade (e sem exageros), dá beleza ao espectáculo. O que creio ser importante é não transformar essa prestação num vale tudo onde a função essencial e primária do estandarte acaba menorizada ou mesmo pervertida.

Mais cuidado, critério e bom-senso é o que se pede. 

quinta-feira, 4 de março de 2010

O Tema Ressaca.


Na noite do passado sábado, em Viseu, durante o jantar do PortugalTunas - que decorreu nas instalações da UCP, estava um alegre grupo a cantar e a tocar quando, de repente, ouço uma melodia que pensava já apagada pelo tempo: Ressaca.

Primeiro, julguei tratar-se de algum grupo pertencente a alguma tuna viseense, porventura conhecedora, mesmo que de forma indirecta, mas não.
Tratava-se da "Tu Na D'Estes".
Foi enorme a minha surpresa perante uma composição que há já tanto ano não era ouvida (pelo menos por mim), e tendo em conta que a Tuna a quem pertence já se extinguira há mais de 1 década: a Tuna Académica da Associação Académica de Viseu da UCP (Fundada em 1992, e de que guardo gratas memórias).

Obviamente que me apressei a perguntar como tinham aprendido, ou de onde tinham obtido, o tema. Mas não sabiam (fazendo lembrar as centenas de temas antigos cujo o autor foi ignorado/esquecido e que hoje surgem com o epíteto de: "popular").
Não deixei de salientar a enorme coincidência de estarem a cantar esse tema, precisamente na instituição cuja tuna era autora do mesmo.

Hoje, ao lembrar-me do facto, fiz uma pesquisa no youtube e lá encontrei o tema, pela mesma tuna (em 2 videos), embora em versões diferentes do original:







Com isto dizer que se por um lado é bom que existam temas que vão perdurando (seja pela sua qualidade musical, seja pelo seu carácter sui generis - que é o caso), não deixa de ser algo injusto que certas composições percam a sua referêcia e passem a não ter filiação.

O tema tem autor e está registado em CD.O tema em causa, Ressaca, tem música de Jorge Menino e letra de vários (eu participei nela), embora não tenha à mão os dados que me indiquem em que nome ficou registada a letra (no meu não ficou, estou certo disso); mas penso ser do Jorge Moreira, sem certezas (a memória escapa-me e o CD tem a enorme lacuna, para não dizer estupidez, de nem sequer referir os respectivos autores dos temas na contra-capa do disco).
O CD em causa foi lançado em 1995, sob o nome "Viseu, aqui eu te canto", com edição de Fortes&Rangel Ldª (Porto).


Abertura

01. Quando a Tuna chega
02. A Tuna a serenar
03. Dançamos na Eira
04. Acorda Donzela
05. Eu não me caso
06. Caloirinha
07. Saudade errante
08. Ao romper da bela aurora
09. Vodka Sostrova
10. Ressaca
11. Pranto Beirão
12. Viseu, senhora da Beira
13. Boémia sentida
14. F.R.A.
Final


Tal como em outros casos que aqui enunciei, seria de bom tom que as nossas tunas tivessem a educação, excelência e carácter de, pelo menos ao publicar os temas que executa, colocar a fonte/autoria desses mesmos temas.
A Tuna em causa lançou recentemente um trabalho discográfico, que ainda não tive oportunidade de adquirir e ouvir. Não sei se o Ressaca consta desse CD (e se sim, se foi salvaguardada a questão dos direitos autorais), mas aparece no cancioneiro da dita Tuna com a letra correcta (sinal de que não terá sido uma recolha meramente oral).


Bem sabemos que o mau costume do copy-paste se regista tanto nos liceus como na faculdade (a era da internet não trouxe só coisas boas, temos de convir), mas, neste caso, porque inter-pares, seria de bom tom algum cuidado porque "A César o que é de César (...)."
De resto, que se cante, e cante muito, pois contribui para a memória da Tuna em geral.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Tuna Compostelana em Lisboa, 1904

Foto Central da Tuna Compostelana
Illustração Portugueza N.º 17, p. 264,  29 Fevereiro de 1904
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)
Illustração Portugueza N.º 17, p. 16,  29 Fevereiro de 1904
(Hemeroteca Municipal de Lisboa)

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Confusão entre Estudantina e Tuna

Não é de hoje que a questão se coloca em saber (se é que é questão de saber, sequer) se Estudantina é o mesmo que Tuna.
Há quem diga que são coisas diferentes, há gente que o jura a pés juntos, há por aí quem pretenda que assim seja.
A esses responder-se-ia liminarmente: há gente que não sabe o que diz, há gente ignorante, há quem jure sobre aquilo que desconhece por inteiro.......há gente que não sabe, não pensa e nem faz o mínimo esforço intelectual de uma reflexão crítica e suportada na sofia.

Tão simples seria que esses ditos defensores da disjunção se dessem ao trabalho, pelo menos, de consultar uma meia dúzia de dicionários de referência para, pelo menos, perceber que se trata da mesmíssima coisa, que são termos sinónimos.
Já não se pede que passem a pente fino os dicionários de referência que foram sendo publicados em Espanha e Portugal desde o séc. XVIII, começando por Bluteau e pelo dicionário de Autoridades (Real Academia Espanhola), sem esquecer os grandes dicionários enciclopédicos, as diversas enciclopédias e outros tantos de música e história da música.
Não se exige que tenham acesso à BNP ou Torre do Tombo (porque nem todos o conseguem, dada a distância geográfica), mas há na net muito por onde procurar, implementada que está a disponibilização de inúmeros livros digitalizados, bem como muitas bibliotecas universitárias (Coimbra, Porto, etc.) onde certamente encontrarão alguma coisa mais que os dicionários mais conhecidos, e mais credíveis da actualidade (Lello, Houaiss, Academia das Ciências).
Não veham, pois, alguns, tentar enfiar patranhas e vender banha da cobra, tentando enganar os ingénuos e, pior ainda, tentar ensinar a missa ao padre.

Há quem chegue a afirmar que estudantinas são tunas que tocam essencialmente música popular e que as Tunas são as que tocam de tudo um pouco. Há quem afirme que Estudantina é assim a modos que.... algo diferente das Tunas (mesmo que acabe por desenvolver a sua actividade no meio tunante), como que para se augurar o direito de pretensa superioridade ou diferença......que não encontra argumentos, de facto (porque não existem sequer, valha-nos Santa Cecília!).

Não, não são coisas diferentes. São coisas exactamente iguais, mas com nomes diferentes (contudo sinónimos).

A Estudantinas nascem em Espanha, derivadas das comparsas carnavalescas, das Bigornias Assim, no séc. XIX, a esses grupos, às comparsas, exclusivamente compostas de estudantes (fosse qual fosse o grau de ensino - por norma liceus, escolas politécnicas, comerciais, etc.) deu-se o nome de "Estudiantinas" - nome provavelmente dado pelo povo a esses grupos (mas não há como saber se foram os estudantes que escolheram esse nome ou não).
Rapidamente chegam a Portugal (uma questão de pouquíssimos anos), onde a fama de uma Estudiantina Fígaro, Estudantina Pignatelli (entre outras), a par com as visitas da Tuna Compostelana, de Salamanca e Valladolid a Portugal, despoleta o 1º grande fenómeno tunante em Portugal.
Em Espanha, o que sucede é que, rapidamente, se criam estudantinas formadas por outras classes, passando a haver estudantinas de operários, de artesãos, estudantinas de gente que se disfarçava de estudantes, criando uma grande confusão (ou pelo menos impedindo um satus próprio aos grupos exclusivamente estudantis). Na América latina, por exemplo, há Estudiantinas de artesãos, de senhoristas.....de tudo um pouco (devido à corruptela do termo)
Em razão disso é que se começa a adoptar o termo Tuna (termo recuperado do conceito do "correr la tuna"), para designar as estudantinas compostas exclusivamente por estudantes.
O facto é que, em Espanha, essa estratégia veio a verificar-se acertada, porque mais ninguém, que não fosse estudante, ousou adoptar essa designação.

Em Portugal não acontece o mesmo. Tanto há estudantinas de estudantes como de populares (nomeadamente em meio urbano), e o termo Tuna (que a Estudantina de Coimbra de 1888 adopta por volta de 1890, cerca de 10 anos após a sua fundação, por exemplo), acaba por ser, também ele, apropriado pelo povo, com especial incidência no meio rural (que ainda hoje perdura).

Em ambos os casos, Estudantina e Tuna dizem respeito a um formato ou tipologia referente ao elenco de instrumentos utilizados, a saber cordofones (a par com percussão ligeira, pandeireta, bombo, castanholas; de flautas doces e, mais tarde, acordeão). Essa é a razão pela qual se acrescentou a designação "Académica" (e mais tarde "Universitária") paa diferenciar as tunas estudantis das demais.

Querer emprestar dicotomias, entendimentos e naturezas diferenciadas à Tuna e Estudantina é patetice e ignorância.
Cada tuna/estudantina é diferente das demais, pelos simples facto de, à partida, serem compostas por indivíduos diferentes, por serem de cidades ou instituições diferentes. Há quem prefira covers, outros originais (e outros ambos); há quem incida mais em temas populares, outros em temas mais eruditos (outros ambos); há quem seja mais do estilo aprumadinho e outros um pouco mais irreverentes (sem cair no exagero que por aí se vai vendo); uns são mais sérios, outros mais efusivos; uns mais amadores e outros mais profissionais, e assim por diante.
Mas justificar essas diferenças na necessidade de espartir designações, não é argumento, não é plausível, não cabe na cabeça de ninguém.....excepto daqueles que de tunas e estudantinas percebem tanto como eu de lagares de azeite.

Em gente letrada, que cursa (ou cursou) ensino superior, em gente que se diz tuno/estudantino (que é a mesmíssima coisa), quantos tiros dados nos pés, minha gente; quanta incoerência, quão lastimável ver alguns a fazerem prova de tamanha incompetência; quão pálida imagem dão alguns de uma realidade sobre a qual deveriam ser exemplo de conhecimento, mas que afinal tão pouco sabem daquilo que dizem promover e viver.

Pelos lados da EUC há quem defenda que não são uma Tuna, que a sua Estudantina é um foro à parte. Mas por mais que a EUC ocupe um lugar especial na história tunante portuguesa, há afirmações que se apresentam vazias e apenas transpiram narcisismo e presunção de superioridade que não condiz.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

600 anos de pseudo-tradição tunante

Quando passamos os olhos por inúmero sites e bibliografa diversa, é comum encontrarmos referências com chancela de dogma, de que a Tuna é uma tradição de 6 séculos, provinda do tempo dos goliardos e dos sopistas,  ou seja uma mui antiga tradição com raízes nas primeiras universidades, blá, blá, blá........ : os argumentos e teses do costume.
Muitos distintos estudiosos partem desse princípio, mesmo que a quase a totalidade deles nunca tenha realizado um estudo profundo e imparcial sobre isso. Aliás, até mesmo em Emilio de la Cruz Aguilar se nota, como em tantos outros, um parcialismo que leva a omitir muitos factos e a colar outros tantos, num exercício similar ao que Dan Brown fez com o Código da Vinci, resultando desse mesmo exercício criativo, uma plausibilidade que poucos questionam, mas que não deixa de ser romance histórico ficcionado.
Tornou-se, pois, pilar histórico de que a Tuna é uma longa tradição de séculos e séculos.
Assim fomos educados e ensinados, é facto.

Quanto disso é, de facto, verdade?

Ora, aí está o grande problema. Quando estudamos, de forma sistemática, com critérios e metodologia investigativa séria, sabemos poder encontrar dados que poderão, eventualmente, desconstruir um conjunto considerável de verdades que até nós mesmos julgávamos inquestionáveis.
É o risco que se corre quando se esgravata o passado, quando se passam longas horas em arquivos perdidos em catacumbas, em documentos esquecidos pelo tempo, quando alguém decide ir mais além das lições canónicas reproduzidas vezes sem conta, tal programa educativo, onde nada se questiona e tudo se decora eassimila como verdade, à boa moda do ensino da história na China ou na Rússia ou, para não irmos tão longe, do país em tempo do Estado Novo.

Sem adiantar, em demasia, aquilo que, em breve, estará nos escaparates, por mão do CoSaGaPe, e baseando-me na informação resultante dessa investigação, desde logo desmistificar e dizer que não. Não, a Tuna não é um tradição de 6 séculos, mas de apenas 1 (um), porque apenas surgida na 2ª metade do séc. XIX, derivada das comparsas carnavalescas que vieram a dar em estudantinas e, aí sim, mais tarde (com o objectivo de distinguir as estudantinas estudantis das populares) o aparecimento da terminologia Tuna, como identificativa de formato musical composta apenas por estudantes (algo que funcionou em Espanha, mas que por cá não, dado que também o foro popular, rural e urbano, adopta e se apropria quer do termo Estudantina, quer do termo Tuna).
Aliás, é nessa altura que, para diferenciar os estudantes dos demais, estes, escolhem o termo tuna, recuperando o vocábulo da sua longa história e diagese, semelhante que era a sua significância com o carácter irreverente, algo libertino e inconformado da jovial idade - tão semelhante, e tantas vezes cruzada, era a vida de muitos estudantes abandonados ao ócio em detrimento do estudo.
É pois, nesse altura, que nascem os tunos (epíteto que passa a significar aquele que pertence a uma tuna), sendo que antes tinha carga adjectival, que tanto podia ser usada para caracterizar um estudante como um pedreiro (significando trapaceiro, embusteiro....).

Antes disso, os estudantes que formavam as comparsas e a estudantinas eram apenas estudantes, eram apenas membros/elementos da comparsa ou da estudantina. Veja-se, por exemplo, que são inúmeras as referências que dizem "los estudiantes de la tuna", ao invés, simplesmente de "tunos", e que, outras tantas vezes se noticiam as tunas nas suas digressões, mas se diz a respeito dos seus componentes que eram apenas estudantes (e não tunos). Significa, isso que, durante algum tempo, a designação "tuno", para referir o estudante pertencente à tuna, não estava ainda em uso, ou em uso generalizado.

Dizer, pois, que antes do séc. XIX não existiam tunas; nunca existiram, segundo os documentos existentes à data.
Antes disso existia o "correr la tuna", o "andar à tuna" (e todos os vocábulos pertencentes à respectiva família de palavras) com a significância de andar vagueando, de mendicidade, de trapaça, de boémia, de marginalidade....no fundo, um conjunto de conceitos que eram pejorativos, tanto aplicados as estudantes como não (aliás não existe distinção sequer).

Obviamente que, pelo prestígio que lhe advinha de estudar na universidade, a figura do estudante acabou por sobressair como paradigma, o que facilitou a tarefa de o pintar das formas mais românticas (e parciais, diga-se), à boa maneira da literatura de cordel da época, enchendo ideários juvenis daquelas sempre presentes imagens quixotescas e dos intemporais romances de capa e espada.
Convenientemente, apagou-se, ou omitiu-se, todo, ou parte, do carácter pejorativo que constituía ser apelidado de tuno ou  dizer de alguém que andava à tuna, na larga maioria dos escritos e estudos sobre este fenómeno (e veja-se que os autores são todos tunos, logo extremamente parciais na escolha dos dados que constituem a sua narrativa).


Só os dicionários mantiveram incólume, ao longo dos séculos, os significados dos termos tuna, tuno, tunante, tunanteiro, etc., sendo que apenas em finais do séc. XIX, e já  no séc. XX, surgem as primeiras referências a Tuna/Estudantina (termos sinónimos) como sendo grupo musical, como formato caracterizado pro ser constituído por instrumentos de cordas.

E as ditas tradições que viriam desde os tempos remotos dos goliardos, dos sopistas, pícaros, etc?

Bem, neste caso, temos  de ir até ao tempo do Franquismo e perceber a influência que o S.E.U. (Sindicato Espanhol Universitário) teve na diagese da Tuna.

Foi nessa altura que a Tuna ganha uma formalidade, regras e enquadramento unificador até aí inexistentes. Mesmo que imposta, essa nova política acabará, no entender de muitos, por trazer enormes benefícios na promoção e salvaguarda do fenómeno.
Com a adopção do traje (o que actualmente conhecemos) e um controle rigoroso sobre o reconhecimento inter-pares e reconhecimento pelo próprio sindicato (para se ser Tuna, e para a ela pertencer, havia que receber autorização e estar em conformidade com os parâmetros definidos pelo regime), a tuna continuava a ser meramente um grupo musical, como sempre o fora até então (e caí aqui mais um mito intemporal).


A Tuna precisava de "pedigree" que suportasse, inclusive, o próprio traje (recuperado dos tempos do Siglo de Oropela Estudiantina Fígaro - supostamente uma mescla de panos de várias épocas retirados do guarda-roupa de um teatro madrileno, conforme atestam os especialistas, dado que, até aí, não existiam becas e jibões, mas apenas o traje escolar, cujo o porte obrigatório fora abolido).


Onde ir buscar?
Nada melhor do que aos muitos costumes estudantis que sempre se registaram ao longo da história, escolhendo/seleccionando os que mais se adequavam à Tuna, adaptando e adequando e, no fundo, tentando uma enxertia que, temos de convir, era fácil e lógica de realizar. De certo modo, acabam as tunas, em Espanha, por recuperar e preservar, muitas tradições que tinham caído em desuso ou no esquecimento,nomeadamente com a abolição do traje escolar.

Não se descarta, de todo, a existência de praxis antes do tempo do S.E.U., dado que, tratando-se de estudantes, e tratando-se de organizações, seria normal que as estudantinas e tunas do séc. XIX tivessem os seus ritos e regras internas (a hierarquia e o respeito pela mesma é algo inerente a qualquer grupo organizado), mas o facto é que só a partir do S.E.U. há indícios claros de práticas que reconhecemos, hoje em dia, como próprias da cultura tunante.


Assim, aquilo a que chamamos de longa tradição tunante mais não é do que a reprodução, adaptada e contextualizada da Praxe Académica, da relação entre novos e veteranos, daí os baptismos e as hierarquias, e os muitos usos similares aos que encontramos na relação entre caloiros e veteranos. A isso se acrescentaram outros ritos e práticas entretanto criados, mas sempre na esfera do acima dito, e sempre na cópia ou inspiração de uma pretensa herança secular (que o é, mas não da Tuna, mas sim dos estudantes).

Em suma, a praxis tunante, a sua tradição centenária, mais não é do que um conjunto adaptado e provindo de uma tradição que não tunante, mas meramente estudantil; um conjunto de ritos importados e criteriosamente escolhidos para se adequarem à Tuna e, assim, lhe conferirem o tal "pedigree".

Hoje são uma cultura muito própria, são uma tradição, mas que convém não confundir, por mais truncado que possa parecer o assunto.

Essa colagem natural, não fosse a tuna constituída por estudantes, não deve, contudo, esconder o sol com a peneira. Não é por os tunos terem adoptado certos usos e costumes estudantis seculares que tal significa que a própria tuna seja tão secular quanto os costumes que assimilou, adoptou e passou a reproduzir.


A Tradição Tunante inicia-se, como acima dito, na 2ª metade do séc. XIX, meramente como expressão musical, só mais tarde se revestindo de práticas e ritos que lhe conferiram o cunho sui generis com que chegou aos dias de hoje.

Querer fazer dos goliardos, sopistas e afins, os tunos de outrora, é uma tentação em que muitos se deixaram cair, fruto do desejo de dar à Tuna uma árvore geneológica mais "nobre" e ancestral, por muito de similar e de parecenças que possamos estabelecer.


Se quisermos, até certo ponto, podemos estabelecer a analogia com os ranchos folclóricos que são, também eles, uma criação "recente" (primeiras décadas do séc. XX) e que reproduzem danças e cantares de outrora, de danças e cantos que o povo sempre cultivou de forma espontânea, sem cariz institucional ou performativo, não significando, com isso, que sejam herdeiros das danças tribais da idade da pedra ou dos bailes medievais ou que existissem ranchos no tempo de Francisco Quevedo.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

VII Jantar de aniversário do PortugalTunas (Viseu 2010)


PROGRAMA


15 horas - Ponto de Encontro e Dão Baco
Local: Restaurante Rio Sul (junto ao Forum Viseu)
Morada: Rua Ponte de Pau.
Contacto: 965408253; 967500835

19 Horas – Jantar
Local: Restaurante Rio Sul (junto à Universidade Católica)
Morada: Estrada da Circunvalação

Contacto: 965408253; 967500835

EMENTA:

Entradas: Caipirinha, Lancheira, Pão com manteiga, Azeitonas, Salgados
Prato Quente de Carne: Grelhada Mista
Bebida à descrição: vinho, cerveja, água, sumos.
Sobremesa: doces variados, salada de fruta
Café
Oferta surpresa a todos os participantes


24 Horas – Festa
Local: Noite Biba (NB)
Morada: Rua Conselheiro Afonso de Melo


PREÇO POR PESSOA:  10 euros


RESERVAS

As reservas serão feitas até dia 23 de Fevereiro para o mail jantarpt@gmail.com.
A reserva apenas será confirmada após envio de comprovativo de pagamento para o NIB 003509300010454823007

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Viagem ao passado

Ao som daquele que será, porventura, o mais belo tema nas tunas espanholas, Imagenes de Ayer, um video que faz um rápido percurso em imagens (parte delas do acervo do Museo Internacional del Estudiante) da diagese tunante do país vizinho.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

O cliché de "O meu conceito de Tuna"

Porque importa realçar, de quando em vez, quem escreve bem, e sabe o que escreve; porque importa fazer eco daquilo que é essencial - e, mais ainda, quando não se tem muito para dizer (ou tempo, até), ler e ouvir quem tem, reproduzo um artigo do colega "As Minhas Aventuras na Tunolândia" que, de forma sucinta e certeira, abordar a questão dos "entendimentos" (que bastas vezes foi aqui referido) e da "mania" que alguns têm (usualmente por arrogante ignorância e autismo umbilical) de achar que a sua medida auto-sustenta o que não passa de miragem.
Vale a pena a leitura, mas ainda ainda a subsequente auto-reflexão crítica.


"A Aventura do "Conceito" de Tuna

Não me restam muitas mais dúvidas a este respeito, salvaguardando uma ou outra mais preemente até por força do estudo empreendido desde há uns anos a esta parte. Em amena cavaqueira com um Tuno, dizia-me ele a dado passo que " ...e segundo o meu conceito de Tuna". Ora, aqui mora um dos maiores equívocos genéticos oriundos do "boom" tunante e que se prolongou até aos dias de hoje, com cada mais ênfase. É que, por muito que custe ler isto, não há, e no caso português, a ideia de "meu conceito de Tuna", lamento informar.

A imensa Babilónia de paletes e resmas de "meus conceitos de Tuna" é somente uma construção muito própria, individual e perfeitamente única que cada um faz quando chega a este mundo particular, não raras vezes confundido com o conceito "a minha forma de estar na Tuna" - uns assim, outros assado e por aí fora - e que se cruza com um 3º conceito ainda, que é a prática reiterada da Academia/Tuna onde se insere. Uma coisa será a forma que cada um tem de estar na Tuna, outra é ainda a forma como o seu meio o molda e define na sua atitude perante a Tuna. Agora, conceito de Tuna Universitária só há um, não há um por cada Tuno porque isso é um tremendo exercício de egoísmo egocêntrico que não raras vezes serve para auto-justificar coisas que, de outro modo, nunca fariam em casa, no trabalho, na sociedade em geral.

Evidentemente que "o meu conceito de Tuna" é um dos maiores inimigos da Tradição Tunante per sí, sem mais delongas, precisamente porque ao livre arbítrio de cada douta cabecinha e não inserido nas naturais linhas delimitadoras de um fenómeno cultural.

Imagine-se por disparate (!!??) que cada romeiro da Senhora da Agonia tinha o "seu conceito de folclore minhoto" ou então que cada Fallera Valenciana tinha o "seu conceito de Fallas": Corriamos o sério risco de ver Minhotas de mini-saía ou Falleras vestidas de bombeiro a apagar as fogueiras. Por aqui se percebe o risco tremendo de medir uma tradição cultural delimitada no temnpo e espaço pelo nosso "conceito de Tuna".

Por força da explosão tunante de idos de 80/90 do Século passado, onde o fenómeno ultrapassou rapidamente a velocidade a que deveria ter andado, sem pontos de referência históricos onde se sustentasse, por falta do pensar a Tuna universitária, delimitando-a no tempo e espaço enquanto tradição cultural, tudo foi paulatinamente "permitido" à sombra do "meu conceito de Tuna". Esta frase é - e com o devido respeito - o Haiti de hoje da Tuna nacional, é um escombro sobre a Tuna, é a pilhagem da Tuna enquanto cultura, é a tragédia. É à sombra do "meu conceito de Tuna" que surgem "coisas" no seu seio dignas de algo que pode ter o seu valor intrínseco mas que de Tuna nada tem. Quem disse que o conceito de Tuna Universitária é algo democratico e democratizante, qual Wikipédia onde todos podem editar, cortar e colar?

Só há um conceito de Tuna Universitária. Há sim várias formas de a exprimir, de a reproduzir, que balizadas pelo óbvio, aceitável e digno, me parecem altamente interessantes. Daí em diante é o "conceito de Tuna" do Quim das Iscas que, de uma segunda para terça, se lembra de formar uma Tuna com sampler´s dizendo alto e bom som " é o meu conceito de Tuna". E isso, santa paciência, não é uma Tuna, é o que ele quer fazer pura e simplesmente á custa da Tuna.

A frase " o meu conceito de Tuna" para lá de uma tremenda irresponsabilidade, é de uma arrogância brutal, ofensiva da Tuna enquanto cultura e no limite, uma barbaridade que vai sustentando certas palhaçadas a que vamos assistindo. " 
(in http://asminhasaventurasnatunolandia.blogspot.com/2010/01/aventura-do-conceito-de-tuna.html)

sábado, 2 de janeiro de 2010

Memória da Tuna, por Eduardo Coelho

Desta feita, um belíssimo artigo, colocado no PortugalTunas, e datado de Fevereiro de 2009, pela mão do ilustre Eduardo Coelho.
Vale a pena a (re)leitura:

"A MEMÓRIA DA TUNA


Por estes dias, muito se tem falado da importância do estudo do fenómeno tuna.



Parece que a preocupação não é só de hoje nem exclusiva de alguns. A julgar pelo muito que se tem debatido no fórum do Ptunas - e sobre os mais diversos aspectos –, dos aprendizes, passando pelos oficiais e terminando nos mestres, a corporação dos tunos manifesta, de forma geral, interesse em conhecer. Alguns, mais raros, manifestam interesse em saber. Outros ainda, e ainda mais raros, procura saber mais.



Resta determinar: saber o quê? De que se anda à procura? E, ponto mais importante: «saber» para fazer o quê com esse conhecimento?


Contudo, o que parece andar arredado dos espíritos é que nós só podemos vir a saber (futuro) aquilo que já se fez (passado). Estamos, assim, dependentes das fontes... ou falta delas.


Ou falta delas.


E já nem é só a nível de quantidade: a qualidade é também um factor primordial. Boa ou má, é a que existe, e é só com base nessas mesmas fontes que se pode interpretar o passado. Não é possível ressuscitar os protagonistas, nem interrogá-los através de um copo, para que a verdade que nos chega do passado possa ser confirmada/infirmada.


Basta pensarmos que, regra geral, as fontes não são de primeira-mão: isto é, raros foram os protagonistas que nos deixaram testemunhos directos (escritos, fotografados) das suas vivências/motivações. De uma forma geral, são terceiros (jornalistas, cronistas, romancistas, simples espectadores) quem nos abre uma janela sobre esses momentos. Assim, há que contar com uma certa dose de distorção – da mais maldosa à mais inocente – na consulta das fontes históricas.



Quantas vezes não são os autores dos documentos quem atribui a si próprios a paternidade de filhos que não tiveram? Quantas vezes não são a inveja, a malevolência e a rivalidade mesquinha a escrever, a filtrar, a ocultar, ou, pelo contrário, o partidarismo, a realçar, a pôr em evidência (e a ocultar, também) os aspectos mais positivos ou mais negativos (conforme os casos) deste ou daquele indivíduo, desta ou daquela instituição? Mesmo assim, a janela, a pintura, a fotografia, a radiografia só nos deixam ver aquilo que está enquadrado pelo obturador do pensamento de quem as revelou, produziu, retocou, ampliou, recortou, segmentou, colou, coloriu.



Falou-se de passado e futuro. Então e o presente?



Tão importante como a procura das fontes do passado é a criação/preservação de fontes para o futuro. Este é o grande trabalho do presente e o melhor património que podemos legar às gerações vindouras: a memória. Mas uma memória tal como cada um de nós a possui: com os bons e os maus momentos; com as alegrias e as fustrações; com o que nos faz estourar de orgulho e corar de vergonha no mais íntimo de nós próprios



Na esmagadora maioria dos casos – se não em todos os casos - , as tunas preocupam-se mais com a sua actividade do que com a preservação da memória dessas actividades. Há magisteres, secretários, bispos, freiras, cavaleiros, noviços... enfim, títulos para todos os gostos. O que não há é... arquivistas com essa função específica e bem definida, nem me parece que esse aspecto seja particularmente valorizado. É importante que cada Tuna-instituição, cada tunante, por si só, dê o seu contributo: preserve a sua própria memória.



E neste particular cabe desde já uma palavra de apreço ao PortugalTunas pelo trabalho que tem vindo a fazer. Ao proporcionar esta plataforma de (des)encontro entre os intervenientes, ao permitir a livre exposição (alguns dirão que não) de pontos de vista, relatos de experiência, discussões por vezes azedas, está já a constituir um dos mais preciosos acervos documentais a que o futuro há-de ter acesso.



O que nos traz de volta às questões iniciais: saber para quê? Que fazer com esse saber?



Há quem queira estudar o passado sob todas as suas vertentes, as luminosas e as sombrias, apenas com o objectivo de saber quem é e donde veio; por que se faz assim ou assado – ou que sentido faz hoje continuar a fazer-se assim ou assado.



Contudo, para muitos outros, o primeiro grande objectivo do estudo do passado é a procura de legitimidade para os comportamentos presentes – particularmente quando esses comportamentos não são legítimos. Hitler desencantou uma raça ariana. Mussolini tentou reconstituir o Império Romano. Salazar virou-se para a Lusitânia. João Baptista da Silva Leitão acrescentou aos seus apelidos «de Almeida Garrett» (com dois «tt» é mais fino). A Sr.ª Maria descobriu que já uma madrinha da sua tia Alzira tinha a bancada de peixe no Bolhão desde o tempo dos Descobrimentos... e por aí adiante.



Quantas guerras, evangelizações, pretensões, heranças, direitos, foram reclamados, justificados, declarados, exigidos em nome de um qualquer passado mal amanhado por entre duas nesgas de papel colado com cuspe e ao qual se deu o nome pomposo de investigação histórica?



Estes são sempre os mais interessados em que se estude o passado – ou melhor um passado que seja feito à medida das respectivas conveniências. Curiosamente, são, regra geral, os que não possuem passado nenhum.



É esta busca desenfreada da legitimização que faz com que se veja por vezes aquilo que não está escrito, fotografado, num exercício de reconstrução do que não foi captado pela objectiva ou do que está escrito nas entrelinhas. E de uma forma tão ruidosa que faz com que se invertam completamente os valores: isto é, que se ignore o que está no papel e se dê toda a importância ao que lá não está.



Saber, sim: mas... saber para quê?



Abraço e


BOA MÚSICA!

Eduardo Coelho "

domingo, 22 de novembro de 2009

O flagelo da "tunite"



Passadas pouco mais de 2 décadas sobre o ressurgimento do fenómeno tunante, temos vindo a apercebermo-nos, ainda que amiúde, do facto deste fenómeno ter entrado numa certa fase de regressão onde se vai notando o esbater, o abrandar do fôlego e ímpeto, quase eufóricos, que subsidiaram o denominado "boom" da década de 80, e inícios de 90, do século passado.
Com a formatura das primeiras gerações tunantes, e como desgaste provocado pela escassez de sangue novo, as nossas tunas envelheceram rapidamente.

Dizia-se, no último ENT, que a nossa comunidade, contrariamente ao registado no país vizinho (onde o processo de maturação cobriu todos os passos naturais), conseguiu, em 2 décadas, o que outros precisaram em 100 anos de experiência: nascemos, com um fulgor tal fogo de palha, multiplicámo-nos (superando qualquer baby-boom), estabilizámos, estagnámos e, por hora, entrámos na fase do envelhecimento (precoce).
Obviamente que, como referia o Ricardo Tavares, o facto de termos atalhado caminho e ignorado hiatos temporais e experienciais, impediu-nos uma maturação paciente, suportada e verdadeiramente, enraizadora (colmatando a brechas com invenção engenhosa: uma peneira a tapar o sol).
Muitos castelos de arreia vão ruindo, na exacta medida em que foram criados.

Actualmente, parece começar a ser preocupação generalizada o facto de muitas tunas estarem já mais a sobreviverem e tentarem não se extinguirem, do que outra coisa qualquer, ou com uma média de idades já respeitável.
Estamos perante uma "Tunite", sinal dos tempo e, certamente cíclica; algo que a história já demonstrou cabalmente no passado, após o primeiro grande fenómeno tunante em Portugal.

No último ENT, sob o tema das Quarentunas e Tunas de Veteranos, ficou bem patente essa preocupação, a qual levou alguns, menos avisados e ponderados, a misturar conceitos e assuntos. Embora o tema versasse sobre os formatos existentes para os que recuperam a sua velha capa e instrumento, depois de mais, ou menos, longa ausência da vida tunante, muitos foram os que ali quiseram, antes de mais, extrair soluções para evitar a extinção dos seus grupos - coisas distintas, é facto.

Como já dito, o tema das Quarentunas, e equiparados, é demasiado "quente", ainda, para ser alvo de estudo e de fórmulas inequívocas, nomeadamente no seio daqueles que ainda pensam mais com o coração do que com a razão.

Ora, essa questão da durabilidade de projectos, o problema na manutenção das tunas deveria ser encarado com uma maior razoabilidade.

Se a Tuna chega ao fim da linha, pelos mais diversos motivos, há que saber, antes de mais, dar-lhe condigno fim, ao invés de esticar a corda a ponto de criar, nos demais, aquele sentimento de compaixão quando se compara o que foi o grupo e aquilo em que se tornou por teimosia de alguns que, embora bem intencionados, acharam haver elixir da juventude para toda e qualquer ruga ou falência generalizada dos órgãos.

Achei, pessoalmente, incoerente que, no país vizinho, houvesse quem defendesse que as quarentunas de faculdade (nomeadamente as que derivam das tunas de origem) teriam a obrigação moral (pelo menos) de evitar a extinção da tuna de onde eram oriundos, tocando com os mais novos, assegurando, por todos os meios, a sobrevivência.
Obviamente que a história, nomeadamente em Espanha, é rica de exemplos de tunas extintas, e de quarentunos cuja tuna de origem (onde começaram) já há muito não existe. É a lei natural da vida; não vejo por que razão fazer disso um drama, por mais triste que nos possamos sentir (nomeadamente quando falamos de grupos que ajudámos a fundar).
Sei do que falo, pois a minha primeira tuna, a da minha universidade, já há muitos anos que se extinguiu.

Querer, teimosamente, prolongar a vida, só porque sim, parece-me um exercício compreensível (do ponto de vista sentimental), mas pouco certo, quando racionalizado.

Pior, ainda, quando pensamos naqueles que defendem as quarentunas como garante da continuidade das tunas de faculdade, prefigurando uma espécie de aparelho de suporte de vida, onde a tuna é entubada e faz respiração artificial e é alimentada por sonda gástrica e litros de soro.

No ENT, foi notória aquela pergunta, a jeitos que de revolta e mágoa, traduzida num "E agora, para onde vou, o que faço?". Bem sabemos que, a determinada altura, uns quantos se afastam e ficam uns resistentes a querer, a toda a força, obrigar o carro a andar só porque ainda tem rodas e carroçaria.
Entendendo o que irá na alma de muitos desses tunos, não podemos deixar de dizer: "Parte para outra!".

É nesse âmbito que se inserem, por exemplo, as tunas de veteranos/quarentunas, quando uns quantos, depois de afastados de um contexto próprio que já passou (seja por extinção, seja por qualquer outra razão que tenha ditado o afastamento), recriam o mester, juntamente com outros em situação igual ou parecida (antigos tunos que já não militam, há muito, nas tunas de origem), mas já em moldes mais adequados a uma situação muito própria, em moldes mais adaptados aos tunos (e não o contrário, onde eram os tunos adaptados ao molde Tuna).
Haja, contudo, o discernimento para se perceber que tunas de veteranos ou quarentunas não são prolongamentos ou "franchisings", antes um modelo diferente, em contexto, também ele diferente, e não necessariamente agrupando apenas tunos provindos do mesmo grupo de origem. Estas tunas "vintage" não ocupam lugar de ninguém senão o seu, tal como o avó não ocupa o lugar de filho ou de pai.
As tunas de veteranos/quarentunas não são, também, upgrades para subsituir, antes um lugar de partilha saudosa e reavivar de memórias, ao ritmo de quem nelas milita.
Mas se a situação não se coaduna com a ideia de veteranos, há sempre a possibilidade de ingresso noutra tuna, de criação de uma nova (mesmo que com menos elementos), ou adopção de projectos paralelos, ao jeito dos Sabandeños ou Gofiones, de que os "Lusíadas" são um exemplo português por excelência.

Assim, por mais que custe (e reconheço o facto), quando é chegada a hora, haja o bom-senso de dizer: chegou a hora, acabou!
Extinguiu-se a nossa querida tuna, que tanto nos deu, a quem tanto demos....... paciência, é a vida!
Que fiquem, antes de mais, as imagens de uma tuna que sai pela porta grande, do que uma longa doença terminal que cria mais dor, empalidece a imagem e reputação, cria cisões e, acima de tudo, leva a cuidados "paliativos" escusados (porque doentes terminais são isso mesmo) e a um gasto de cinergias que teriam melhor emprego em projectos alternativos ou noutros formatos tunantes.
Cuidados paliativos em Tuna são esconder ao corpo os problemas levando-o a utopias e ilusões que agravam, mais do que ajudam a tomar decisões, que mesmo dolorosas, são necessárias. desligar a máquina.

Haverá uma idade para tudo, e um fim para tudo. "Nada se perde, tudo se transforma", dizia Lavoisier. A cada um compete saber quando.
O facto das Quarentunas terem estabelecidos os 40 anos como idade mínima (pois poderiam ser cinquentunas, por exemplo), e as tunas de veteranos outra fórmula qualquer, não é imposição que faça bitola (poderá, um dia, sê-lo, quiçá - mas ainda é cedo para essa discussão), até porque é uma determinação para o próprio grupo, e não uma reforma automática que obrigue, seja quem for, a reformar-se chegando a esta ou aquela idade, a este ou aquele patamar.

No ENT de Castelo Branco, esperavam, alguns, medidas miraculosas e soluções de largo espectro para o evitar das mortes anunciadas, elixires de juventude para projectos moribundos ou em conjectura de dificuldades de recrutamento e renovação.
Não as há. Cada qual, na sua realidade e contexto, deve procurar solucionar o melhor que puder e souber. E quando não for possível, será, provavelmente, porque não há mesmo como, restando dar espaço ao curso natural das coisas.

Umas vezes operam-se milagres, novas gerações salvam a coisa e ressuscitam o projecto, outras chegam ao fim da linha, e nada a fazer.

O tempo em que as tunas encantavam, a euforia de há uns anos já passou, tendendo o fenómeno a estabilizar, embora isso também se faça à custa da chamada selecção natural, à custa da extinção de muitos grupo (e nascimento de outros, porventura), de reajustes, de mudança.
O tempo dirá de sua justiça.