domingo, 29 de dezembro de 2019

Uma Estudantina/Tuna popular no Minho, em 1900

Foto de 1900 que retrata um grupo de romeiros, organizados em estudantina/tuna, com bandeira e os instrumentos próprios a este tipo de agrupamento.


Almanach Illustrado do Brasil Portugal, 1.º Ano. Lisboa, 1900, p.133.

domingo, 1 de dezembro de 2019

O 1.º de Dezembro e as Tunas

As celebrações do 1.º de Dezembro eram, a par com as festividades de final de ano (com saraus e récitas), as festividades mais importantes das comunidades escolares, sobretudo colégios e liceus.
A partir, principalmente, da década de 1880 em diante, temos diversas notícias dessas festividades relativas à restauração da independência organizadas pela associações estudantis e pelas instituições, tornando-se, não poucas vezes, uma forma de congregar e promover o espírito de pertença, o sentido de corporação.

As tunas dos colégios e liceus tinham nos festejos do 1.º de Dezembro um dos pontos altos da sua actividade.


A diferença das festividades do 1.º de Dezembro, nos colégios e liceus, com as demais, é que a escola saía à rua. Era festejos partilhados com a população e não apenas actividades intra-muros, restritas à comunidade escolar.

As tunas que existiam nesses colégios e liceus eram quase sempre o ponto alto das récitas organizadas e das arruadas, constituindo-se como estandarte da própria escola.

Estranhamente, no que toca aos grupos universitários, a data não colhe a mesma importância, pelo que raras ou inexistentes as festividades em que se associam as poucas tunas académicas do ensino superior (não sendo comum sequer as universidades  ou associações estudantis promoverem festejos).

Com o quase desaparecimento das tunas de colégios e liceus, as festividades do 1.º de Dezembro ficaram órfãs das tunas, sendo já poucas as que ainda procuram evocar essa data e a centenária ligação que a mesma tinha com a tuna estudantil, mantendo uma réstia de tradição.

sábado, 23 de novembro de 2019

As Tunas e Estudantinas mais antigas do mundo.

Já em 2017 tinha sido apresentada, na revista Legajos de Tuna, n.º1, uma relação das mais antigas tunas/estudantinas em actividade, no mundo.

Ficava provado que Portugal é um museu vivo da tradição tuneril, com a mais longa tradição ininterrupta de grupos em actividade, fosse no meio civil ou académico.
Por mais que isso melindrasse um certo tunamundista de pacovia, a verdade é quem quiser encontrar evidência histórica e exemplos de tradição mais genuína, era em Portugal que tal se podia contemplar.


Mais recentemente, tal lista foi actualizada, na obra "A França das Estudiantinas" e, uma vez mais, se confirma que, apesar da tradição ter nascido em Espanha, o estudo do fenómeno não pode omitir nem fazer-se sem passar pela evidência de que é fora de Espanha e do arco hispano-americano que parte essencial da investigação e da construção da narrativa se faz - e que conceitos tuneris não podem edificar-se passando ao lado de tal património e de uma legitimidade atestada(e incontestável, sublinhe-se), como sucede com Portugal, França, Suíça, Bélgica ou mesmo a Itália, muito menos por parte de pseudo-organismos que ostentam a designação "Mvndi", mas apenas elegem o mundo que lhes convém.

A Tuna/Estudiantina não se resume ao contexto hispano-americano, nem sequer ao ibero-americano.
E muitos menos se resume e diz respeito apenas ao foro académico - e ainda menos ao universitário (ao contrário do que dizem certos puristas tunomundeiros).
A Tuna nasceu no contexto popular. Foi com as "estudiantinas", essas comparsas carnavalescas, que tudo começou.
Foram, de facto, os estudantes que catapultaram o fenómeno, mas a reboque; e não são nem os seus donos e muito menos os proprietários exclusivos da res tvnae.
Não, a Tuna não é um fenómeno exclusivamente estudantil, e muito menos universitário.
A documentação histórica prova-o cabalmente. E mais do que a documentação, as provas vivas de tunas/estudantinas centenárias  (civis e académicas) atestam isso. E contra factos, não há argumentos.

Nota: existe um lapso no que se refere à Tuna Académica do Lice de ´vora, cuja fundação é de 1900.

In SILVA, Jean-Pierre -  "A França das Estudiantinas, Francofonia de um fenómeno nos séc. XIX e XX". CoSaGaPe, 2019, pp. 191-192.



quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Cartazes sem Tuna



O título é provocador, mas a intenção é precisamente essa: pôr as pessoas a criticamente reflectir.
É uma opinião, e vale o que vale; mas assenta na constatação.

Quem prestar alguma atenção à iconografia presente nos cartazes de encontros/festivais/certames de Tunas em Portugal, certamente que já se terá deparado com uma imagética cuja qualidade é indesmentível do ponto de vista do design e do trabalho por detrás da concepção desses mesmos cartazes.

Está na moda, de há uns larguíssimos anos a esta parte, criar cartazes baseados em trabalhos que são alterações a cartazes de filmes, séries e afins.
Também está na moda pôr em evidência temáticas diversas, através das imagens/desenhos de vária índole (locais emblemáticos, referências históricas....), procurando "tunalizá-las" (ou, pelo menos, usá-las em benefício do "marketing tuneril" - nem sempre alinhadas com as comuns regras publicitárias).
São evidências.

Mas, no meio disto, há um enorme senão.
Passando o olhos por muitos desses cartazes (belíssimos trabalhos do ponto de vista do design e mestria na área do desenho e modulação de imagens), algo salta imediatamente à vista: pouco ou nada (quase sempre nada) referente à Tuna em cada vez mais cartazes que se vão produzindo.
Há cartazes que se não tivessem escrito "Festival/Encontro de Tunas" e tivessem a info escrita das tunas participantes, em nada situariam o evento no mundo tuneril.
De tanto se querer "inovar", chega-se ao ponto de despir o cartaz da iconografia essencial: a Tuna.
Do ponto de vista das regras publicitárias, poderíamos dizer que tal retira eficácia. Do ponto de vista estritamente tuneril....... porventura também.

E, verdade seja dita, tal só nos empobrece.
São cada vez menos os cartazes cuja imagem, cuja iconografia remete directamente para Tunas.
Tirem a componente escrita e o cartaz deveria, ainda assim, passar a mensagem de que se trata de Tunas. Mas a verdade é que, quase sempre, o que fica, retirado o "lettering", é algo sem sentido algum neste contexto, sem qualquer identificação à res tvnae.

E independentemente do facto do certame possuir uma designação própria (referente a uma cidade, uma personagem histórica...), a iconografia deveria sempre ter a Tuna em destaque, porque o desenho não é cartaz do posto de turismo, produto de uma empresa qualquer, headline de bilheteira de cinema ou associação de defesa do património.
De tanto se querer inovar, a Tuna é muitas (demasiadas) vezes omitida, como se ao serviço avulso de um conceito subliminar.

E quando não temos imagens totalmente despropositadas com o mundo tuneril, temos muitas outras a centrar-se em generalidades que também não são inequívocas (desenhos com guitarra ou notas de música, com imagens de fado/fadistas, estudantes trajados), porque servem igualmente a outros (fado, tradições académicas/Praxe, Música/grupos musicais de todo o tipo....), pese embora mais próximas (e melhor que o "nada a ver" que cada vez mais vemos).

Claro que ainda vamos tendo cartazes com imagens (fotos) de tunas em destaque, e ainda (mas já mais raros, com desenhos alusivos directamente à Tuna/Tuno). Valha-nos isso!
Mas são cada vez mais os cartazes onde nada, mesmo nada, remete para aquilo que estão a promover e o contexto em que se situam.
Não apenas do ponto de vista formal, em termos publicitários, deixa a desejar, mas pouco contribui para a promoção da comunidade, creio.



Em Espanha, os cartazes de eventos tuneris primam por pôr em evidência, na sua iconograifa, o universo tuneril; e o desenho/pintura ainda é uma arte muito acarinhada para representar o mester tunante (sendo algumas peças verdadeiras obras de arte).


O que tem vindo a desaparecer é o desenho propriamente dito, criado expressamente para o efeito.Desenho de tunas, de tunos. Ainda os há, mas parecem em extinção. E não é por falta de talento, estou seguro.
São opções. Mas são opções benéficas? O leitor que ajuíze.

Por oposto, no país vizinho (e não só), há uma aposta forte no desenho, 
 sinal de que ele ainda tem a sua importância - e com maior probabilidade de sobreviver no tempo (e se tornarem peças de referência e de colecção).

Depois dos atropelos cada vez mais constantes no que respeita aos instrumentos próprios à Tuna, parece que o tema do cartazes evidencia, também ele, um sintoma de que algo precisa de ser repensado, creio, face ao que, em muitos casos, consubstancia um afastamento cada vez maior da Tuna em relação a si mesma, correndo o risco de desenraizar a sua identidade, diluindo-a em sofismas evolutivo-coiso por força de modas que a Tuna tem, supostamente, de acompanhar e responder.

O risco é que possamos  ter cada vez mais "Tunas de lettering", cuja imagem e o que delas se observa, de facto, se distancia cada vez mais da matriz que as enquadra, legitima e alimenta.

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Livro- X Anos da RaussTuna de Bragança


Foi recentemente publicado uma autobiografia da RaussTuna a propósito dos seus 10 anos de história.



Uma obra que se saúda, pois contribui, também ela, para a memória da comunidade.
Com a designação "A Tuna - Uma Década de Histórias", a obra foi lançada a par com um CD também ele com o mesmo título, contendo 10 temas do grupo.

Esta monografia, da lavra de Bruno Miguel F. Gonçalves, retrata o percurso, histórias e episódios que a  RaussTuna vivenciou desde a sua fundação até aos dias de hoje.


Como se organiza, os seus protagonistas, as suas indiossincrasias, trabalhos discográficos, temas e actuações, são assuntos abordados num livro com pouco mais de 400 páginas em formato A5.

Se alguma crítica pudéssemos apontar é para uma obra excessivamente volumosa (há livros com narrativas tunantes de mais de um século, como a TALE, a TAUC ou próprio Qvid Tvnae) que não têm essa quantidade de páginas), mas ficam narrados, de maneira mais pormenorizada e exaustiva, o que foram estes 10 anos de  rica actividade.
E o livro não desilude, quando toca a narrar essa viagem pela sua década de existência.

Se algo gostaríamos de ter encontrado, era um intróito ao contexto tuneril em que a RaussTuna nasceu, procurando retraçar o meio/panorama tuneril local em que surgiu, e, eventualmente, ter até ido mais longe, tentando, do arquivo/hermeroteca municipal, trazer à liça  alguns dados históricos sobre a tradição tuneril de Bragança (ligada aos liceus e colégios locais e da região[1]), como sucedeu com o livro "10 Anos de Infantuna"[2].

Seja como for, é um livro que enriquece o património bibliográfico da tuna portuguesa e pelo qual está de parabéns a RaussTuna, um jovem tuna com 10 anos, mas já com muito andamento.

NOTA:  Um agradecimento à RaussTuna pelo envio generoso de um exemplar da obra e CD evocativos da efeméride do seu X aniversário.




[1] Em Torre de Moncorvo, em inícios dos séc. XX, há uma estudantina/tuna do Colégio de Santo António. Vd. SOUSA, Fernando - Moncorvo. Da Tradição à Modernidade. Edições Afrontamento. Porto, 2009, p.54.
[2] SOUSA, João Paulo - 10 Anos de Infantuna.  Palimage, 2002.


quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Livro - A França das Estudiantinas


Uma obra publicada em Outubro deste ano de 2019, e que aborda uma realidade até agora inexplorada, ao longo de mais de 200 páginas em formato A4.
O fenómeno das estudiantinas no território francês, mas igualmente nas suas antigas colónia e na francofonia.

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Mais de meio milhar de grupos detectados só em França (fora os demais países), com cerca de 300 documentos iconográficos a acompanhar, este é um livro inédito que revela um pouco mais sobre o amplo movimento que constituíram as orquestras de plectro com a designação "estudiantina" (que não se confinou à esfera Ibero-Americana nem sequer ao meio estudantil) em todo o mundo.

Feita breve nota à origem das estudiantinas, inicia o percurso pela presença (numa listagem por anos e locais visitados) da presença de estudiantinas españolas em França (trabalho pioneiro nesse capítulo), seguindo depois pelos primórdios dos grupos e apresentando o conceito musical que cedo balizou o significado de "estudiantina" como grupo musical com características próprias e como tipologia objectivamente circunscrita.


 

Posteriormente (e após abordar as muitas centenas de festivais musicais locais, nacionais e internacionais de/ com estudiantinas), apresenta, naquilo que será um segundo grande capítulo, a lista de evidências, por anos, encontradas de grupos com a designação "estudiantina" (desde a década de 1880 até finais do séc. XX).
Ainda neste grande capítulo, o tema do reportório e da discografia.

Uma terceira parte poderá englobar o caso das antigas colónias (especialmente do Magreb, embora chegue até ao Vietnam ou mesmo ao Canadá), o que alarga os horizonte e as balizas do que, até agora, se pensava ser o alcance do fenómeno.


O epílogo faz um súmula e apresenta números, por países, a par com alguns outros dados estatísticos (que não enfadam), e estabelece a ligação existente entre grupos apelidados de "estudiantina" e outros que, apesar de terem outras designações, fazem
parte da mesma família (tratando-se do mesmo embora com nomes diferentes).
Importante, também a lista que elenca, até inícios do séc. XX, os mais antigos grupos (Estudiantinas/Tunas) ainda em actividade - onde claramente se verifica que Portugal e França apresentam a mais antiga tradição ininterrupta.











terça-feira, 29 de outubro de 2019

Falar e fazer - Nos antípodas de uma concepção.


Não, não se trata de uma apologia do ego, nem pouco que se pareça.
Mas importa que seja dado o seu a seu dono, sem penachos, sem "folie des grandeurs", mas sendo, acima de tudo, honesto.
Todos temos direito a envaidecer-nos com o trabalho bem feito. Qualquer pessoa normal sente gosto e orgulho de um trabalho bem feito que é reconhecido, mesmo que com lapsos aqui, acolá.

Mas, volta e meia,  aparecem ressabiados a criticar o que é feito, dizendo que os tempos são outros - incompatíveis com a oferta que é produzida porque, pasme-se, a linguagem é jurássica e a malta "de agora" quer é outras formas de partilha de informação, outras plataformas, outros modos de fazer.

Outros modos de fazer... não fazendo coisa nenhuma, diga-se.

Murphy bem pode criar uma nova lei: "São sempre os mesmos a criticar sem fazer, e sempre os mesmos a fazer e a serem criticados por isso". 


 "Nunca serás criticado por alguém que esteja a fazer mais do que tu; antes serás criticado por alguém que esteja a fazer menos que tu". Nesta citação, atribuída a Steve Jobs, nem sequer podemos falar em "fazer menos", pois que, em boa verdade, os críticos que se manifestam (honra lhes seja dada, porque dão a cara - contrariamente a outros que "mordem pela calada"), achando que o que é feito nunca satisfaz, são pessoas sem qualquer obra feita.
Atiram postas de pescada, mas fazer...está quieto!

A verdade, e é uma infeliz realidade, é que são sempre os mesmos que encontramos a fazer, a apresentar, a criar conteúdos, a apresentar materiais, dados, informações.
A produção informativa e formativa que existe concentra o mesmo grupo restrito de pessoas, as quais não têm culpa da inércia de terceiros.
São sempre os mesmos que encontramos e a culpa não é deles; antes pelo contrário, ainda bem que há quem faça. Pena é não haver mais. Mas esses "mais" teimam em não aparecer (apenas uns "menos", armados em "mais").
Sempre os mesmos que encontramos a investigar, criar e/ou dinamizar portais, blogues, publicação de livros, criação de grupos e fóruns, páginas diversas, a produzirem conteúdos, artigos de investigação, a participarem em encontros, palestras, conferências, que encontramos como colaboradores de diversas entidades.... a custo zero para quem usufrui desse labor.

Quem faz não está isento de reparo, mas é estranho que essas críticas sejam atiradas por quem não possui qualquer credibilidade. Palavras sem obras são tiros sem balas. Muito barulho, muito fumo e, depois, desvanecida a névoa, ficam os mesmos de sempre porque os delatores, esses...rabinho entre as pernas.
Depois vêm as fáceis e costumeiras acusações de sobranceria de quem mais não tem do que acusar, agarrando-se a apreciações de forma e a fulanizações néscias, numa vitimização que procura apoios que escondam a sua própria insuficiência.

Acusados de "velhos do Restelo", muitas vezes em surdina, como pessoas que não compreendem o tempo actual (como se estivessem mortos), pretendendo que o que viveram nada tem a ver com o que é hoje a Tuna. Tudo artifícios estéreis, ignorando ou omitindo um facto: conhecem (porque estão e porque estiveram). Viveram como protagonistas (ensaiando, organizando certames, compondo temas, participando, liderando estruturas.....), mas também observam, estudam, contactam... com um mundo que ajudaram a edificar (no alvores do "boom") e que continua sendo o mesmo, apenas com mais e novos protagonistas, atravessando modas, tendências, altos e baixos.
Fazem sombra? Não. Nem fazem nem nunca estiveram à sombra, contrariamente a quem lá vegeta e se lembra, quando o rei faz anos, de deitar a cabeça de fora e piar.

Mas não é nada de novo. Há tempos foi publicado um artigo (por um desses que estão sempre e tem currículo para falar de cátedra) que abordava precisamente esta questão.

Há pessoas que, de umbigos desmesurados, ainda não perceberam que não existe monopólio sobre obra feita. O que existe são os que falam e, do outro lado, os que fazem (e podem falar com alguma propriedade).
Todos têm direito à sua opinião. Mas opinar para pôr em causa o trabalho meritório feito, carece de algo mais e terá credibilidade na exacta medida que vem acompanhada de obra feita.





Ora, argumentar com quem só manda bitaites é conversa estéril.
Como dizia um amigo (também daqueles que pode falar de cátedra), "Só há discussão quando ambos os lados estão em paridade (...) Opiniões, toda a gente tem; Infelizmente toda a gente as dá. E é por isso mesmo que raramente há discussão: quando só um dos lados apresenta factos (obra)...".

Por isso, quando aparecem os arautos dos novos tempos, pensando descobrir a pólvora, cheios de alternativas, de planos, de projectos...para "modernizar", trazer a Tuna ao séc. XXI - por contraposição com o que consideram "démodé" ou "obsoleto", só temos a dizer: "Força! Façam, apresentem, criem!".
Só que, quando a isso desafiados, quando se diz "Então façam!", fazem lembrar a história bíblica dos apedrejadores que começaram a sair um por um.
É que não basta clamar por novos design, novas plataformas, novas funcionalidades, novos layout, como se tudo se resumisse a trabalho de cosmética. É preciso ter conteúdos.
E para criar conteúdos é preciso queimar a pestana: ler, estudar, conhecer, investigar, comparar, escrever....fazer.

Concede-se que nem todos estão vocacionados, nem todos possuem disponibilidade, que outros não dispõe de "Know how" ou de interesse. Mas, pelo menos, e são a maioria, é pessoal que não se atira a disparar por invejoso belicismo.
Usualmente é malta que reconhece, como é devido, o trabalho feito, o mérito, esforço e procura enriquecer-se desse mesmo labor.
Outros criticam - muitos sem sequer aferir do trabalho.... muitos sem abrir uma página.

Falar é fácil. Sempre foi.
Mas a caravana passa, como sempre passou, porque, contas feitas, seremos pesados pelo que fizemos, sendo as boas intenções de boca atiradas para o esquecimento e os contestatários avulso enterrados sem lápide.

terça-feira, 3 de setembro de 2019

Comunidado de Apoio a um Investigador da Tuna

Terça-feira, 03-09-2019.

COMUNICADO DE APOIO A UM INVESTIGADOR DA TUNA:

Nos últimos dias, tivemos conhecimento de um conjunto de factos lamentáveis que merecem todo o nosso repúdio. O protesto legítimo perante uma situação injusta, feito em privado, por parte de um dos mais antigos e prestigiados investigadores da História da Tuna, e a exigência que fez de que lhe fosse apresentado um pedido de desculpas público deram lugar a uma grotesca campanha de assédio ao investigador visado através das redes sociais.

Ao publicar no Facebook um texto no qual se esquiva às responsabilidades e, portanto, sem apresentar as desculpas devidas, a outra parte implicada – a saber, Félix O. Martín Sárraga – deu origem a que mais de uma dezena de indivíduos tenham enviado mensagens insultuosas ao agravado.

Assim, nós, os investigadores abaixo assinados, manifestamos por este meio o nosso apoio ao nosso companheiro, assim como o nosso repúdio à forma de actuar do Presidente de Tvnae Mvndi ao longo do tempo, neste e noutros casos, nos quais distorce a verdade a seu favor, sem reconhecer os seus muitos e reincidentes erros de forma e conteúdo.

Assinado:
Ramón Andreu Ricart
José Carlos Belmonte Trujillo
Eduardo Coelho
Juan Antonio Díaz Sánchez
Fernando Fernández Martín
Jean Pierre Silva
João Paulo Sousa
Ricardo Tavares
Héctor Valle Marcelino

domingo, 1 de setembro de 2019

Da Estudiantina Española do Carnaval de Paris à Estudiantina Española Fígaro, 1878.


Não é de agora que a teoria de que a Estudiantina Española Fígaro é um "upgrade" da Estudiantina Española que esteve no Carnaval de Paris, em Março 1878.
Já tinha partilhado essa desconfiança em 2015, com Félix Sárraga, mas que acabou por ele preterida, não sendo abordada no artigo em que colaborei.
Na altura, achei muito curto que, após o sucesso da Estudiantina Española, no Carnaval de Paris de 1878, tenha havido tempo suficiente para, aproveitando a fama desse périplo pela capital francesa, um grupo ter surgido do nada e a tempo de criar tudo quanto foi necessário para iniciar, em cerca de 2 meses, uma tournée europeia.
Não passa de conjectura, mas alguns dados obtidos, permitem, pelo menos, analisar e explorar essa questão.


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Recordemos:

- A Estudiantina Española  regressa de Paris em finais de Março.
- Em finais de Maio (ca. 2 meses depois), temos a "Fígaro" em Portugal a dar concertos, daí seguindo (em Agosto) para Paris, Londres, Áustria, Alemanha, Itália...
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Ora, entre finais de Março e inícios de Maio, foi preciso arranjar elementos, confeccionar trajes (copiados/inspirados da Estudiantina Española), elaborar um repertório (suficientemente vasto) e ter os ensaios necessários.

Depois, era necessário estabelecer os contactos para firmar contratos com os locais (teatros, salas de espectáculo) onde iria apresentar-se, definindo alojamento, despesas, receitas (que a "Fígaro" é um grupo que vai para ganhar dinheiro, como qualquer outra companhia artística, independentemente de também fazer concertos caritativos).

Nesse tempo só havia correio e telegrafia e os promotores necessitavam quase sempre de se deslocar previamente para falar, aferir condições, assinar documentos. Isso levava tempo.

Foi possível tudo isso em 2 meses (nem tanto)?

Se foi, há que reconhecer que faziam melhor do que na actualidade, onde mesmo com Internet, telefone, mails, etc., dificilmente se consegue organizar a viagem de uma Tuna ao estrangeiro assim tão expeditamente.
Ainda hoje, formar uma Tuna de raiz,  ter ensaios com repertório musical exigente (peças instrumentais), ter traje próprio confeccionado, marcar digressão internacional a vários países, etc., é virtualmente impossível em 2 meses.

Na sua edição de 13 de Abril de 1878[1], o periódico francês "Le Monde Illustré", apresenta gravura (desenho de M. Vierge a partir de croquis de M. Urrabieta[2]) de uma serenata feita pelos estudantes de Madrid ao embaixador de França em Madrid, em reconhecimento do bom acolhimento feito em Paris à Estudiantina (mais adiante votaremos a isso).
Nessa altura, ainda nada se sabe da "Fígaro".


Além disso, ninguém conhecia a "Fígaro" para a convidar assim de repetente. Teoriza-se que se terá aproveitado da fama da Estudiantina Española, como que fazendo-se passar por ela - o que terá facilitado e agilizado as coisas.
É possível que possa ter havido esse aproveitamento, como é possível que, afinal, se tratasse de uma reconversão do grupo, com novos protagonistas, uma espécie de "trespasse".
E é esta uma teoria plausível: o tal "upgrade", com mudança de protagonistas, reajuste ao nome do grupo (e, quiçá - já que estamos no plano das conjecturas, o reaproveitamento dos trajes do primeiro grupo).
Se sabemos que a viagem a Paris e Londres estava a ser programada com antecedência (mais adiante o referiremos), como pode ter sido possível nada se saber? Teriam usado indevidamente o nome da Estudiantina Española ainda ela existia para contratualizar a sua ida ao estrangeiro (Portugal incluído)? 

Não se pode descartar essa possibilidade, especialmente quando confrontados com o  seguinte artigo, que abaixo apresentamos, de um periódico português que fomos encontrar na Biblioteca Nacional Brasileira:



Repare.se que o artigo refere explicitamente que a "estudantina hespanhola DEU LOGAR á organisação de uma sociedade de 22 professores que formaram em Madrid uma orchestra de bandurras e guitarras (...) o sr. Juan Molina procura contratá-los para os apresentar em Paris e Londres. Se o contrato se podesse effectuar a tempo de poderem vir a Lisboa, era uma excelente acquisição".

Sabemos que a expressão "dar lugar" pode ser lida sob três perspectivas: uma resultando noutra, que uma veio ocupar o lugar da outra ou que uma surge a pretexto (inspirada) na primeira.


Jornal da Noite, 8.º Ano, N.º 2231, de 22 e 23 de Maio de 1878, p.2.

Num jornal brasileiro (com "delay") diz-se que a Estudiantina que vem a Lisboa é a mesma
que esteve em Paris. Golpe publicitário ou estamos perante um grupo sucedâneo?
(O Cruzeiro (RJ), Ano I, 10 de Junho de 1878,  N.º 160, p.2.)


Estranha é a referência ao facto da "Fígaro" ter dado diversos concertos antes de vir para Portugal, já que as investigações até agora conhecidas, a par da nossa pesquisa, mostraram-se infrutíferas quanto a evidências explícitas da "Fígaro" em concertos.  Não se encontram referências nem à "Fígaro" nem ao seu maestro "Dionísio Granados", antes da presença em Portugal (nenhuma notícia de se estar a preparar, de estar em ensaios ou se prever a sua ida ao estrangeiro - algo pouco comum, diga-se). Seriam os tais concertos os dados, afinal, pela Estudiantina Española?

Da nossa investigação[3], sabemos que a Estudiantina Española, regressada de Paris, dá concerto no "Teatro Y Circo del Príncipe Alfonso", em Madrid", a 3 de Abril[4].

Depois surge uma notícia curiosa que refere que a Estudiantina Española que foi a Paris foi dissolvida:

"Se ha dissuelto por completo la estudiantina que estuvo en Paris.
Mejorará el estado sanitario"[5]

A última frase parece evidenciar que o autor da notícia tinha algo contra o grupo. Além disso, a verdade é que não se dissolveu, pois a Estudiantina Española volta a apresentar-se no dia 10 de Abril, no "Teatro de la Opera",  em concerto a favor da Associação Francesa de Socorros[6] e novamente no "Teatro Circo del Príncipe Alfonso" (também apelidado "Circo Rivas") em benefício dos estabelecimentos de caridade de Paris[7].

Estudiantina Española que esteve em Paris.
La Academia, Tomo III, N.º 14, de 15 de Abril de 1878 p.212


Estudiantina Española que esteve em Paris.
La Academia, Tomo III, N.º 16, de 30 de Abril de 1878, p. 253.


Temos igualmente uma notícia interessante que afirma que há uma nova estudiantina (pelos vistos de cariz misto):

"Teatro y circo del Príncipe Alfonso - Compania Arderius. - Universidad libre de enseñanza libre. - Curso de 1878. - En vista del extraordinario cuanto justo éxito obtenido po rla estudiantina española en Paris, la empresa de este teatro, deseosa siempre de colocarse á la altura de las circunstancias, ha contratado otra estudiantina que no duda merecerá de los madrileños la misma acogida que tuvo la otra de los praisienses.
Nota. Para evitar interpretaciones erróneas, esta estudiantina dara serenatas á toda la clase de personas, sin distincion de sexos, edad, ni opinion política.
Catedrático universal de mundologia, don Franscisco Arderius.
Alumnos y alumnas
Nombres y asignaturas: ..."[8]

Passando os olhos pelas lista de componentes, se percebe ser um grupo misto, de cariz  burlesco ("Arderius" aparece na imprensa caracterizado com bufon).

No dia 25 de Abril, temos a Estudiantina Española a dar concerto no Teatro Príncipe Alfonso"[9], assim como no dia 26[10] e no dia 30 (a favor dos náufragos da costa cantábrica)[11].

Sabemos que nessa altura, havia 7 estudiantinas em Madrid[12] (as quais se reuniram para concerto em favor das vítimas de um naufrágio ocorrido na Costa da Cantábria - já mencionado):

- Estudiantina intitulada Tuna de San Carlos;
- Antigua Tuna de Sán Carlos;
- La Simpática;
- Mefistófeles;
- Estudiantina Española;
- la Tuna escolar
- El Carnaval español.

Não há, como se pode ver, até esta altura (e já estamos no último dia de Abril), qualquer referência à existência de uma Estudiantina Fígaro. Parece, no mínimo, estranho, tendo em conta que o artigo português refere explicitamente que a "Fígaro" tinha já dado vários concertos, considerados grandes triunfos.
Dar-se-ia o caso da "Fígaro" ser um projecto organizado em segredo e que só se deu a conhecer quando partiu para Portugal? Pode ser que sim, mas parece pouco plausível que nenhuma notícia se encontre anteriormente sobre ela.

No dia 5 de Maio a Estudiantina Española está em Arranjuez, a dar concerto para a família real[13].
Sabemos, entretanto, mais 2 nomes de membros da Estudiantina Española que esteve em Paris (além de Zabaleta e Castañeda), e são eles os senhores Clemente Ibarguren e Eugenio Urranduraga[14].



La Correspondencia de España, Ano XXIX, N.º 7443, de 09 de Maio de 1878, p.2.


Em publicação de 15 de Maio, surge informação que adianta que foi dissolvida a Estudiantina que foi a Paris, e onde se afirma que o concerto dado á família real em Arranjuez, marcou a última aparição do grupo[15].
Em 16 de Junho (já a "Fígaro" estava a actuar há quase 1 mês em Portugal), é recebida, pelo Rei, uma comissão da "disuelta estudiantina Española"[16].

A primeira notícia que encontrámos da "Fígaro", em periódicos espanhóis, data de 21 de Junho, referente à sua passagem pelo Porto[17].


Não deixa de ser confuso.
Não podemos garantir a pés juntos que uma coisa deu na outra, mas dizer o contrário também carece de provas mais concludentes.
É estranho que, até à aparição da "Fígaro" em Portugal, pouco o nada se saiba dela antes e que possibilite traçar uma linha cronológica inequívoca.
Sabe-se que terá sido inicialmente contratada para ir a Paris e Londres (em Agosto), mas que se terá conseguido que antes passasse por Lisboa (onde esteve de Maio a fins de Julho)[18].
Portanto, a teoria de que a Estudiantina Española, que foi ao Carnaval de Paris possa, de alguma forma, ter evoluído para a "Fígaro" não é, de todo, descabida.
Faltam dados para esclarecer tacitamente todo este "mistério" que recai sobre esta fase "anónima" da "Fígaro, antes do seu primeiro concerto em Portugal, a 27 de Maio de 1878.


Fica aberta a questão para futuras linhas de investigação.





[2] Seria membro da Estudiantina? É muito provável.
[3] Que delimitámos entre a chegada da Estudiantina Española do Carnaval de Paris e a chegada da "Fígaro" a Lisboa.
[14] Boletin de Loterias y de Toros, Ano XXVIII, N.º 1420, de 13 de Maio de 1878, p.2 ; El Globo, Ano IV, N.º 943, de 13 de Maio de 1878, p.4 e que se pode contrastar com MARTÍN SÁRRAGA, Félix O. - Crónica del viaje de la Estudiantina Española al Carnaval de París de 1878 según la prensa de la época. Tvnae Mvndi, Artículos de Investigación. Vol. 2., 2016, pp. 5-55.
[18] Diário de Notícias (Lisboa), 14.º Ano, Nº 4414, de 27 de Maio de 1878, p.1.